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31.3.06
Helena, li a tua resposta com muita atenção. É dificil respondê-la com a seriedade que merece num único post, e ainda mais difícil sem que isso se torne um exercício longo e maçudo (pelo menos para terceiros). Alguns tópicos também interessantes, como o do ódio da mulher judia que conheceste e as anedotas do horror, deixo - por enquanto - de fora, os outros tento aqui tratar em separado por parágrafos. Sobre o estudo em questão volto a não me pronunciar. O meu post não quis meter-se na discussão sobre se ele é correcto ou errado, de boa ou de mã-fé, anti-semita ou não. Ele era sobre a provocação do Dragão e das reacções que ele provocou, e sobre a sua tese original, ou seja, nâo a do estudo citado, mas de que o discurso sobre “os judeus” está condicionado, pela ameaça de classificação sumária de anti-semitismo. Apoiei esta tese e ainda defendi que o post não é racista (excluindo o relatório desta questão). Sobre a linguagem: Criticas a minha defesa do termo “pencudos” e o termo “os judeus” que empreguei no meu post. Aqui tenho efectivamente alguns pontos a corrigir, porém talvez noutros termos como esperas. “Pencudos”: Tinha um familiar que se referiu invariavelmente aos asiáticos como “olhos obliquos” (“Schlitzaugen”). Mesmo quando o fazia num contexto aparentemente inócuo, ao falar das suas viagens como turista “Neckermann”, isso incomodava-me a mim e os demais ouvintes na família, pois na verdade era impossível não reparar no ressentimento subjacente e na boçalidade da postura. Da mesma forma, quem por hábito se referia aos judeus como “pencudos”, deixaria transparecer o mesmo ressentimento e igual falta de educação. Assim, não vou perder tempo a discutir contigo se a minha ressalva, em que disse que a denominação dos judeus como “pencudos” [...] teria, à partida, nada de racista, foi suficiente. Melhor teria feito ao admitir desde já que “pencudos” obviamente foi e pretendeu ser depreciativo. (O Dragão me corrija...) Mas mantenho, mesmo assim, que o título “O Sacrossanto Lobby dos pencudos” é perfeitamente legítimo, e não só à luz da defesa abstracta da liberdade de expressão. Não me ocorreu por um momento que o Dragão seria pessoa para chamar por regra “pencudos” aos judeus, à maneira do meu tio; estava e está claro para mim que usou a expressão intencionalmente, num registo irónico, retórico, isto é: literário, no caso até claramente identificável como tal. Assim ela deixou de ser um indício dum ressentimento racista. E como não me interessam as palavras, mas a ideia subjacente, que aqui era a provocação de reacções como a tua para ilustrar a sua tese, não tinha e não tenho nada a objectar ao título daquele post. Também fizeste-me um reparo ao meu emprego do termo “os judeus”, que aceito no caso em que falei do “lobiismo político dos judeus” (no último parágrafo). Aqui deveria ter dito “lobiismo político judeu”. Mas não no exemplo por ti apresentado: “O livre discurso sobre questões relacionadas com os judeus”. Como podia dizer isto de outra forma? Não haverá questões relacionados com os judeus? Será que isto não existe, “os judeus”? Claro que existe. Não foram perseguidos e assassinados no holocausto judeus, ou seja pessoas que acidentalmente eram judeus, mas os judeus. E não só o inimigo define os assim. O Nuno Guerreiro não está a documentar a história de, mas dos judeus portugueses. A receita alemã: Dizes, e quem pode negá-lo, que “a mistura entre informação, trabalho individual de tomada de consciência dos preconceitos subjacentes aos discursos, e inclusivamente a censura de certas expressões”, teve resultados muito positivos no combate ao anti-semitismo e o racismo no país do Holocausto. Hoje estes males ali não são mais expressivos do que noutros países vizinhos. Talvez numa sociedade que acabara de sair do Império dos Mil Anos, a criminalização do discurso racista e a censura da linguagem realmente foram necessárias. Mas custa-me de aceitá-lo, por uma objecção de princípio. Acredito na informação, no trabalho de tomada de conciencia dos preconceitos subjacentes aos discursos sim, na censura de certas expressões não. Já discordámos sobre isto na ocasião do debate sobre os cartoons dinamarqueses. Não gosto das medidas coercivas e nomeadamente não confio nos seus resultados. Elas suprimem, mas não vencem o ressentimento. As primeiras duas apostam na liberdade e na responsabilidade do homem, a última pretende e consegue comportamentos irreflectidos e irracionais. Talvez perguntar-me-as, se acho realmente que a minha insistência piquinhas na ideal e pura liberdade terá qualquer importância, perante uma receita que tem tido tanto sucesso a prevenir um novo Holocausto? Não qualquer crime: um Holocausto. - Respondo: Sim, acho. Pois não é secundário apostar na liberdade e responsabilidade. Para quem acredita na possibilidade de que a luta contra o mal não se limita a uma eterna luta defensiva, a resposta só pode ser sim. A censura, a regulamentação da linguagem podem assegurar hoje o efeito desejado, mas amanhã, como já ontem foi o caso, outra censura, outro condicionamento da linguagem assegurarão semelhante efeito, mas para um objectivo inverso. Por isso, a insistência na liberdade de expressão não é um luxo, não é excesso, não é algo para que, como o Diácono Remédios diria, “não havia necessidade!” Há necessidade, sim! Criticar Israel sem ser anti-semita: Apresentas um - aliás excelente - site alemão como exemplo como é possível criticar a política de Israel sem ser arrumado no campo anti-semita. Este site é um bom sinal, e certamente haverá outros. Mas a sua existência não desmente o condicionamento da discussão pública da política de Israel pela ameaça de ser classificado como anti-semita. O artigo de Ralf Dahrendorf, que recentemente comentei, ilustra-o de forma flagrante. Um último aspecto, talvez um pouco lateral ao debate, mas importante: Depois do choque de se confrontar com o indizível crime cometido pelos seus compatriotas, muitos alemães de bem desenvolveram nos anos a seguir ao Holocausto um filo-semitismo, uma reacção inspirada por sentimentos de vergonha e culpa e com a vontade de reparar, de compensar algo, mesmo ciente de isto ser, no essencial, impossível. Muitas alemães um pouco mais velhos do que eu foram por exemplo trabalhar durante uns meses num kibbuz. Sendo os judeus os príncipais vítimas, apoiá-los, identificar-se com eles foi uma resposta natural. E instalou-se uma equação moral simplista, que rezava mais ou menos ser decente = ser contra o holocausto = ser filosemita. O que se quase esqueceu era que o Holocausto nos obriga não só em relação aos judeus. Mais do que a expressão extrema do anti-semitismo, o Holocausto foi a falência da mais elementar humanidade. Por isso o primeiro mandamento a formular a partir desta experiência não deve rezar “Não sejas anti-semita!”, mas “Não abandonarás a tua humanidade!” Etiquetas: antisemitismo, cidadania, moral, sel 30.3.06
Aristoteles e Phyllis (Hans Baldung Grien) Como se pode comprovar em cima e também aqui, os filósofos não costumam de fazer boa figura ao meter-se com as mulheres. Além de Sócrates comprovaram isto, entre outros, Schopenhauer e Nietzsche, e Aristoteles. Este advertiu o seu ilustre aluno Alexandre de precaver-se dos poderes das mulheres bonitas. O que levou Phyllis, a amante deste, a procurar uma maneira de livrar-se do concorrente pela influência sobre o conquistador. E reza a história que não lhe foi difícil aplicar os seus encantos ao filósofo, e adestrá-lo de tal maneira que este se dispôs a fazer de cavalo para ela e de responder às ordens do seu pingalim. Reza a história também que Alexandre, longe de considerar Aristoteles doravante desacreditado, concluiu pela validade do aviso do seu mestre, de que realmente, quando lida com mulheres, o homem deve assegurar que o pingalim continue nas mãos próprias. E é sabido que os filósofos não deixaram de apregoá-lo durante os próximos séculos até há pouco tempo, apesar de, como é sabido também, não terem deixado, na prática, muitos exemplos da sua capacidade de seguí-lo. 29.3.06
Playmate da semana: Animadora celestial (Rajastan/Uttar Pradesh, séc.11) O exílio não é necessáriamente um desalojamento geográfico. (post alterado) 28.3.06
Gottfried Helnwein: Selektion (Instalação para o 9.11.1988, Colónia) 27.3.06
Um post do Dragão, que foi publicado já há alguns dias, deu origem a um debate, por vezes azedo, sobre a sua propriedade e o seu conteúdo eventualmente anti-semita. O post é simples. Faz referência a um estudo americano que descreve o (suposto?) poder do lóbi judeu na política externa americana. Para além da citação, o Dragão prediz as reacções indignadas – censórias - ao seu post, e para que a sua previsão se cumpre, escolhe um titulo provocatório: “O Sacrossanto Lobby dos pencudos”. Teve sucesso. Entre outros, a Helena deixou-se provocar, e surgiu o debate em que ainda participava, com destaque, a Zazie. Não li o tal estudo, por falta de tempo e de pachorra: se ele está mal ou bem feito não sei, para mim está adquirido que os judeus têm um lóbi poderoso nos EUA e não só, não está adquirido que isto é algo em si censurável. Agora, se o livre discurso sobre questões relacionados com Israel ou os judeus está condicionado pela omnipresente ameaça de se ser moralmente e sumariamente disqualificado como racista e anti-semita, já me interessa muito, não só em nome da liberdade de expressão como em nome da justiça e da razão. E está, não há dúvida. Ainda há dias apontei-o num artigo duma pessoa tão respeitável e lúcida como Ralf Dahrendorf . E o Dragão não está só ao sentir a mordaça, ao sentir de que não se pode dizer com a-vontade o que se pensa sobre esta questão. Para mim e para os alemães em geral a auto-censura neste domínio tornou-se virtualmente uma segunda natureza. Uma segunda natureza ainda incómoda para quem não interiorizou o tabu de tal maneira de que este deixa de acusar a sua existência. Para este ele significa um permanente peso na consciência, a noção duma deficiência moral. Como se o anti-semitismo fosse uma doença, um vício que ainda não conseguímos erradicar completamente, que, aliás, porventura será impossivel de erradicar em nós e por isso nos obriga ao combaté-lo eternamente... Um preço que estariamos, os alemães, talvez justamente a pagar, enquanto povo, se acreditasse que povos deviam pagar preços, e pagável comparado com outros preços que outros povos tiveram de pagar. Mas claro que não acredito nisto, não acredito em limitações do pensamento, que infelizmente e invariavelmente decorrem de tabus. Por isso, embora que não aprecio especialmente o estilo do Dragão, que frequentemente substitui uma argumentação leal pela sua retórica draconiana, simpatizo aqui com a sua provocação e suprimo o bem adquirido reflexo pavloviano de sacar o cacete do anti-semitismo. A denominação dos judeus como "pencudos" ou dos membros de etnias africanas como "pretos" tem, à partida, nada de racista, e deduzir do facto de que essas expressões são usados no discurso racista a sua proscrição é um exercício do politicamente correcto, que mostra a sua qualidade lamentável, que é a preguiça intelectual. Não há nada mais nocivo para a inteligência do que o cerceamento da linguagem. Eu sei que a crítica da Helena ao post não se centra só no “pencudo”, mas sim no estudo referido e a sua alegada tese que, como disse, não li, mas acredito na Helena e no Dragão que seja essa, de que a política externa dos EUA está refém dum lóbi judeu poderoso e por ele é levado a agir contra os próprios interesses e os de grande parte do mundo. Se isto é o caso ou não, acho eu, devia poder discutir-se sem que se chame logo anti-semita a quem o defende. Devia, mas é de facto impossivel. Detesto teorias de conspiração, e algumas das teorias mais detestáveis foram usados contra os judeus – aliás, seguramente são eles que levem a taça no campeonato mundial dos objectos de teorias de conspiração – mas não decorre da detestabilidade delas que não existem conspirações. Curioso salto de raciocínio: Porque estou a falar em conspirações? Só falavamos em lóbi. Aí está o problema: Basta alguém referir um lóbi judeu cuja influência ultrapassa as fronteiras dum país, vêm nos irremediavelmente à cabeça, entre outro, “os Protocolos dos Sábios de Zion”, e a “Conspriação do Judaismo Mundial”, tão badalada pelos Nazis, e colocamos o pobre diabo na desagradável companhia dos defensores destas teorias, e identificamo-no com os seus objectivos. Na prática isto significa que na discussão do lobiismo político dos judeus só ha dois campos: Os que defendem que este não existe ou que não existe nele nada de criticável, e os anti-semitas. Isto não é aceitável. Etiquetas: antisemitismo, cidadania, moral, sel 26.3.06
Ouçam esta mulher interessante no player:
UND EIN SCHIFF MIT ACHT SEGELN Meine Herren, heute sehen sie mich Gläser abwaschen. Und ich mache das Bett für jeden. Und Sie geben mir einen Penny und ich bedanke mich schnell. Und Sie sehen meine Lumpen und dies lumpige Hotel. Und Sie wissen nicht, mit wem Sie reden. Und Sie wissen nicht, mit wem Sie reden. Aber eines Tags wird Geschrei sein am Hafen. Und man fragt: Was ist das für ein Geschrei? Und man wird mich lächeln seh'n bei meinen Gläsern. Und man fragt: was lächelt die dabei? Und ein Schiff mit acht Segeln Und mit fünfzig Kanonen Wird liegen am Kai. Und man sagt, geh wisch Deine Gläser mein Kind. Und man reicht mir den Penny hin. Und der Penny wird genommen und das Bett wird gemacht, und es wird keiner mehr drin schlafen in dieser Nacht. Und sie wissen immer noch nicht, wer ich bin. Und sie wissen immer noch nicht, wer ich bin. Und in dieser Nacht wird Getös sein am Hafen und man fragt: "Was ist das für ein Getös?" Und man wird mich stehen sehen hinterm Fenster. Und man fragt: "Was lächelt die so bös?" Und ein Schiff mit acht Segeln und mit fünfzig Kanonen wird beschiessen die Stadt. Meine Herren, da wird wohl Ihr Lachen aufhören Denn die Mauern werden fallen hin Und am dritten Tage ist die Stadt dem Erdboden gleich. Nur ein lumpiges Hotel wird verschont von jedem Streich Und man fragt: Wer wohnt Besonderer darin? Und man fragt: Wer wohnt Besonderer darin? Und in dieser Nacht wird ein Geschrei um das Hotel sein Und man fragt: Warum wird das Hotel verschont? Und man sieht mich treten aus der Tür gegen Morgen Und man sagt: Die hat darin gewohnt? Und das Schiff mit acht Segeln Und mit fünfzig Kanonen Wird beflaggen den Mast. Und es werden kommen hundert gen Mittag an Land Und werden in den Schatten treten Und fangen einen jeglichen aus jeglicher Tür Und legen ihn in Ketten und bringen ihn mir Und mich fragen: Welchen sollen wir töten? Und mich fragen: Welchen sollen wir töten? Und an diesem Mittag wird es still sein am Hafen Wenn man fragt, wer wohl sterben muss... Und dann werden Sie mich sagen hören: ALLE! Und wenn dann der Kopf fällt, sag' ich: Hoppla! Und das Schiff mit acht Segeln Und mit fünfzig Kanonen Wird entschwinden mit mir... ______________________ E UM BARCO COM OITO VELAS Meus Senhores, hoje vêem-me lavar copos, E fazer a cama para qualquer um. E dão-me um penny, agradeço logo E vêem os meus trapos e o espeluncoso hotel. E não sabem com quem falam. E não sabem com quem falam. Mas uma noite haverá gritos no porto. E perguntarão: que são estes gritos? E vão ver-me sorrir com os meus copos. E vão dizer: O que ela se ri com isto? E um barco com oito velas E com cinquenta canhões Está atracado no cais. E dirão: Vá, lava os copos, menina. E deixam o penny para mim. E levo o penny e faço a cama, mas ninguém mais vai lá dormir nesta noite. E ainda não sabem quem sou. E ainda não sabem quem sou. Mas uma noite haverá burburinho no porto e perguntarão: “Que burburinho é este?” E vão ver-me atrás da janela. E perguntarão: “Porque ela sorri tão maldosa?” E um barco com oito velas vai abrir fogo sobre a cidade. Meus senhores, aí vai acabar o Vosso riso Pois os muros vão desmoronar E no terceiro dia a cidade estará arrasada Só um hotel merdoso poupar-se-á. E perguntarão: Quem tão especial mora nele? E perguntarão: Quem tão especial mora nele? E nesta noite havertá gritaria pelo hotel, E perguntarão: Porque o hotel é poupado? E na manhã vão ver-me sair pela porta, E dirão: Foi ela que lá morava? E um barco com oito velas E com cinquenta canhões Embandeirará o mastro. E cem desembarcarão ao meio-dia E entrarão na sombra E apanharão um a um a cada porta E apresenta-los-ão a mim em correntes E me perguntarão: Qual havemos de matar? E me perguntarão: Qual havemos de matar? E neste meio-dia haverá silencio no porto Quando perguntam quem tem de morrer... E então vão ouvir-me dizer: TODOS! E quando cai uma cabeça direi: Opa! E um barco com oito velas E com cinquenta canhões Desaparecera comigo... (Die Dreigroschenoper - texto Bertolt Brecht, música Kurt Weill) Generosamente disponibilizado pela Susana aos homens. Disclaimer: O melhor manual não garante a boa prática. 25.3.06
O novo blogue de Carlos Cunha (A Quinta Coluna, Partículas Elementares, Terra da Alegria), Afonso Cruz (Erro de Paralaxe, Alerta Amarelo), Maria João Lima (Erro de Paralaxe) e Bruno Santos (O Círculo de Dentro). Tem que haver quem mande (2)
O que a tragédia do Iraque me lembrou a mim, que perante de qualquer poder está habituado a perguntar, antes de qualquer outra coisa, pela sua legitimidade, é a verdade amarga que ainda antes da questão da sua legitimidade vem a necessidade de ele ser exercido. 22.3.06
Verdadeiras playmates são as três graças de Hans Baldung Grien, cuja obra erótica é vasta tanto em quantidade como no leque dos seus interesses. Noutra altura, postarei um gravura sua verdadeiramente hardcore, pois também as há. Para ver estas graças na íntegra, clica-se na imagem. Adenda 24.03.06: Continuando neste post para deixar o palco por mais algum tempo às raparigas, aproveito para manifestar senão discordância, a minha dúvida em relação ao post do Tiago, citado pelo Afonso Bivar, sobre o que interessa nas mulheres. Claro que não vou contradizer o Afonso quando traduz para ingénuas o termo "uma mulher interessante", mas o alinhavamento do Tiago peca por defeito. O que falta? É me difícil dizer. Mas estas raparigas aqui servem-me, ao lado de para outras coisas, como argumento para o que existe além dos atributos, no meu entender sobre-estimados, evocados pelo Tiago. Nem as suas maminhas pequenitas, nem as nádegas de que pouco se pode dizer, nem a "relação olhos-lábios" das suas carinhas são tão excepcionais, mas não hesito em afirmar que teria mais prazer em conhecer estas moçoilas do que qualquer das protagonistas do paraíso do Miguel - ele não me leve mal. Mais do que os atributos físicos interessa-me nestas meninas aquilo que me levam a imaginar de que são capazes de fazer! Isso não será inteligência? 21.3.06
O número de posts que assinalaram o terceiro aniversário da invasão do Iraque nos blogues onde se encontram os apoiantes mais empenhados da primeira hora desta guerra. 20.3.06
ou o mistério de Harvard e a falência do hotel que admite judeus. "Iremos juntos, se o quiser, investigar as leis da sociedade, a forma como estas leis se impõe, o método com qual podemos descobrí-las; mas depois de termos demolido todos os dogmas, por amor de Deus, não deixaremo-nos seduzir para indoctrinar as pessoas agora por nossa parte; não cometeremos o mesmo erro como o seu compatriota Lutero, que, depois de derrubar a teologia católica, colocou no seu lugar uma teologia evangélica com excomunhão e anátema. Os últimos três séculos a Alemanha esteve principalmente ocupado de recuperar da borrada de Lutero; não deixaremos a humanidade com uma porcaria semelhante. Não faremos de nós, por estarmos na vanguarda dum novo movimento, líderes duma nova intolerância vaidosa e não aparecamos como apóstolos duma nova religião, mesmo se essa religião fosse a religião da lógica, a religião da razão. Aceitaremos todas as objecções e encorajemo-las, e desencorajemos toda a exclusividade, toda a mística. Consideremos nunca uma pergunta como ultrapassada, e quando ficamos sem argumentos, comecaremos, se for necessário, de novo, com eloquência e ironia. Sob esta condição entrarei com muito gosto na sua associação. Noutro caso, não." (Carta de Proudhon a Marx, 17.05.1846) É verdade que os manifestantes destes dias em Paris não se comparam com os seus pais em ’68. Estes lutaram generosamente para algo que julgaram melhor para todos. Os de hoje só defendem a propriedade. A sua. Para quem isso não é óbvio, lembro o termo alemão para direitos sociais adquiridos: "Sozialer Besitzstand", propriedade social. Estranho como todos os apóstolos da propriedade tanto se indignam com estes estudantes. Porque no fundo estão de acordo: O que uma vez têm, ninguém em circunstância alguma deve poder obrigá-los a largar. Contra estes e os manifestantes, estou com Proudhon. 19.3.06
Muitos parabéns pelo aniversário, Afonso! Estou feliz de poder oferecer-te nesta ocasião a solução para o teu dilema! * Sabedoria popular alemã Tilman Riemenschneider: Christus Salvator 18.3.06
Comovido mas também muito atrapalhado tomo conhecimento da minha elevação ao estado de Cavaleiro. Será que o meu alfaiate está a altura do desafio? E terei de procurar o velho Knigge, que já não abri desde a adolescência. Tirá-lo daquela prateleira de cima, onde tão bem estava a apanhar pó. Mas isto é uma honra que não se recusa. Muito obrigado, Susana! P.S.: Podes continuar a tratar-me por tu. 17.3.06
É muito meritório o sacrifício que o João Tunes faz ao ler regularmente o Avante e de disponibilizar trechos das barbaridades que lá se escrevem. É bom lembrarmo-nos de vez em quando que os pacíficos adversários na nossa política interna continuam a colocar-se, com todo o a-vontade, ao lado do terror, se isto lhes serve para defender a sua mitologia descredibilizada. Na primeira lutei freneticamente contra o facto de que não tinha nada a dizer. Na segunda deparei-me com o problema de não conseguir dizer o que tenho a dizer. Desde então posso interessar-me sem vergonha pelos segredos do meu ofício. É muito mais honroso ser um falhado do que uma fraude. Haverá uma poética que vale um tostão que não é uma tentativa de clarificar o processo da própria produção artística? Ou seja, que aplica a alguém para além do seu autor? 16.3.06
Formas claras e sensuais. De beleza intemporal. O modelo 3107 de Arne Jacobsen. Se não fosse por mais nada, mas claramente é, o franco atirador recomenda-se pela extraordinária selecção de quadros que o Luis lá expõe. Quase sempre com sub-títulos inspirados. Deixa-me no entanto frustrado que, possivelmente por causa destes sub-títulos, não refere os seus autores, e assim dificulta o alargamento da minha cultura geral... Ainda não assinalei a mudança da Isabella da Sapo para o Blogger, onde está agora com um novo blogue límpido que se chama De Dingle a Amalfi. E aproveito para pedir desculpas ao João Tunes, por ter gozado com a sua permanente mudança de endereço do blogue. Aprendi entretanto que ele e outros clientes da Sapo são obrigados a isso pelas limitações deste servidor. E o Rimbaud worrier Manuel finou-se, infelizmente. "É verdade que, em teoria, é possível opormo-nos às políticas israelitas sem sermos anti-semitas. No fim de contas, há críticos dessas políticas entre os próprios israelitas. No entanto, a distinção tem-se tornado cada vez mais dificil de manter e, com a atitude defensiva dos judeus e o silêncio incómodo dos seus amigos, o debate público fica livre para os realmente anti-semitas, mesmo que se limitem a utilizar uma linguagem anti-Israel." Ralf Dahrendorf formula no Público de hoje este dilema com que sofro há muito. Mas não esboça nenhuma forma de o resolver, nem sequer de o encarar. Pelo contrário: Embora reconhecendo o terreno minado que é o debate do conflito Israel-Palestina nomeadamente para amigos críticos dos judeus, e os efeitos nefastos que tem a sua consequente abstenção nele, não deixa de (re)colocar algumas das mesmas minas no seu proprio artigo. Diz ele "em teoria, é possível opormo-nos às políticas israelitas sem sermos anti-semitas." Quer dizer: Na prática não? Com boa vontade podemos ver este "em teoria" como sintoma da tibieza que aqui muito bem evoca como problema, mas que ele próprio não consegue superar (talvez devido a um complexo de culpa de quem é, tanto como eu, de origem alemão). Sem boa vontade este "em teoria" transforma todo o lamento sobre a cedência do debate crítico da política israelita aos anti-semitas em pura hipocrisia. E o que é falar "linguagem anti-Israel"? Outra mina, este termo. Quem se queixa da dificuldade do discurso sobre este conflito deveria ser o primeiro a procurar precisão e abster-se de terriveis simplificações como esta. O que me motivou a escrever este post foi o dilema acima referido. Mas não posso deixar passar o ponto central que Dahrendorf faz no seu artigo. O ponto de que existe um novo anti-semitismo, que está ligado a Israel. E que "este não pode ser combatido de forma eficaz apenas pela educação e pelos argumentos." Pergunto-me: Com que então? Com que é que se pode combater um (res)sentimento, uma ideologia - na verdade nunca chegou a sê-lo, enfim, algo que existe no plano dos sentimentos e das ideias - para além de com educação e argumentos? Só me lembro, assim de repente, da censura. E depois, claro, da violência. Em vez das ideias, pode combater-se os portadores das ideias. É isso que Dahrendorf propõe? 15.3.06
Playmate da semana: Nu avant miroir (Balthus) 14.3.06
Encontrei-o no gabinete de arquitectura em Berlim, em 1994, quando lá voltei por uns meses para ganhar o dinheiro que em Portugal não conseguia. Ele era um fugitivo da guerra de Bósnia, um rapaz muito magro com ca. de 25 anos, e trabalhava como operador de CAD, onde se distinguia pelo empenhamento e pela sua solicitude extrema. Muitas vezes, ele e eu, imigrantes temporários sem vida privada, permanecíamos no atelier a trabalhar até muito tarde. Aí, depois dalguma reserva inicial, começou a responder às minhas perguntas curiosas sobre o que lhe acontecera, num alemão espantosamente bom, aprendido em meio ano. Era de Mostar, filho dum homem de letras, professor universitário, personalidade respeitada na cidade, de quem falava com muito carinho e admiração. Tinha uma irmã que também vivia na Alemanha, mas não em Berlim e que devido ao seu estatuto de fugitivo de guerra não podia visitar. Não sei se era por delicadeza excessiva minha ou pela resistência consistente sua, mas ainda hoje não sei ao certo da sua condição étnica. Insistia em chamar-se Bósnio, e antes da guerra, percebia-se, todos da sua familia foram bons jugoslavos. Com o tempo no entanto entendi que o pai era da origem croata e que a sua mãe não. De qualquer maneira, na sua família, nem à condição étnica nem à religiosa se dava relevo. Até ao eclodir da guerra civil, ele estudara engenharia aeronáutica na sua cidade natal. Falava da sua vida antes com nostalgia, que se percebia ser dum rapaz da classe média educada, despreocupado, inteligente, com ambição profissional mas também com apreço pela boa vida. Um dia a milícia, nunca me disse qual, entrou na casa e levou-o. Durante três noites e dois dias espancavam-no numa cave na cidade. Conhecia pessoalmente alguns dos seus maltratores. Um era um antigo colega do liceu, que até tinha frequentado a casa dos seus pais, em tempos de miudo. A resposta porque este lhe agora fazia isto, que Jirco solicitou e o outro lhe deu, de que seria em vingança por uma namorada roubada, não lhe fazia qualquer sentido. Depois levaram-no para um campo de concentração, algures na floresta. Para além dos espancamentos, torturaram-no com choques eléctricos. E havia apelos em que tinham de apresentar-se em fila para serem seleccionados. Tinham de dizer o seu número: Um, dois, três, quatro... Depois escolheram ou os numeros pares ou os ímpares para levá-los para uma “viágem de negócios”. Os que foram, nunca mais voltaram. Jirco atribuia o facto de não ter perdido a sanidade mental à paisagem, que foi de rocha calcária, cujas pedras podia usar como giz. Com a ajuda do giz, chegou a recapitular toda a álgebra linear e a geometria analítica que aprendera. Deu-lhe conforto que as leis da matemática continuavam válidas. Por dois meses ficou no campo, até que o seu pai conseguiu identificar o seu paradeiro e comprar a sua liberdade, por 20.000 DM. Depois foi, primeiro na bagageira dum Mercedes, até a Croácia, e à seguir via Eslovénia e Austria para Berlim, onde lhe foi concedido, por enquanto, o estatuto de fugitivo de guerra. Aqui recebia também tratamento médico para remediar as consequências da tortura. Entre outro estava impotente. Dizia-me que por um lado tinha muitas saudades da sua cidade, que descreveu como maravilhosa, e da sua família, claro, mas por outro não conseguia imaginar-se capaz de voltar a viver lá, mesmo se fosse em segurança, e encontrar na rua, dia sim, dia sim, pessoas que fizeram estas atrocidades. E não lhe interessava em nome de quem e à quem, porque, como sempre fez questão de realçar, nesta guerra não havia bons. Pensei eu para mim, se ele é ainda capaz de dizer isto, depois de tudo, talvez não tem razão. 13.3.06
Estou surpreendido com o fraco eco que esta notícia causou em Portugal. Ou eu tenho andado muito distraído ou foi a Graça Franco no Público de hoje quase a única que comentou, e ainda infelizmente de forma crítica e sentimental, esta medida sensata em favor do bem público, proposta pelo liberal exemplar, que é o Ministro do Interior e possível futuro Presidente francês Nicolas Sarkozy. Sou só eu quem valoriza devidamente as enormes vantágens desta medida? Logo aos três anos, começar-se-á a separar o trigo do joio. Mas não é só a selecção e a criação dum cadastro de enorme utilidade futura o que se alcança com isso. Não! Já com esta idade dar-se-à uma hipótese às crianças de se redimirem e de ainda encontrarem o caminho para tornarem-se cidadãos úteis e pacíficos. Para isso prestar-se-á um tratamento psicológico e psiquiátrico. Talvez nem todos sabem que já se encontram, para este efeito, drogas muito eficazes no mercado, como o Ritaline. Para começar, não recomendaria tornar o tratamento logo obrigatório. Achava melhor começar por incentivar os pais em questão para colaborar. Podia colocar-se o tratamento como condição para o ingesso no infantário, por exemplo. Se isto não se revela suficientemente eficaz, então sempre podia recorrer-se da obrigatoriedade. Mas como liberal espero que não seja necessário. Em qualquer caso, o cadastro terá grande utilidade nas mais diversas situaçãoes. Os serviços sociais, por exemplo, quando têm de decidir sobre se uma criança deve ou não ser retirada da sua família, poderão servir-se também destes dados, tal como da informação sobre como os pais colaboraram ou não no tratamento. A sociedade em geral poderá proteger-se dos não curados, ou seja dos delinquentes em potência, através da exigência rotineira da apresentação deste registo nas diversas ocasiões em que o cidadão ameaça se terá de candidatar: À escola, à faculdade, ao emprego, pelo menos ao emprego público, para não falar de determinados cargos públicos especialmente sensíveis. Evidentemente poderá poupar-se a exigência dessa apresentação, se se optar pela inclusão destes dados, imagino aqui por exemplo categorias de risco A,B,C,D, logo no B.I. A vantagem deste cadastro pré-criminal, em complemento ao cadastro criminal, para a polícia na perseguição do crime é tão óbvia que quase não vale a pena referi-la. Realmente só estranho que os liberais e admiradores declarados de Nicolas Sarkozy ainda não exaltaram esta ideia excelente e propuseram-na para a implementação também em Portugal. 12.3.06
Jethro Tull: Living in the Past (1972) No player. Quando era miudo não tinhamos Playstation nem Internet, mas Das grosse Spielebuch, um livro de jogos de família, como "O jogo do balão". Os jogadores eram passageiros dum balão que estava na iminência de cair. A única salvação consistia em atirar um passageiro pela borda fora. Cabia a cada jogador, que impersonava uma personalidade da sua escolha, argumentar porque não fosse ele o a sacrificar na votação final. 11.3.06
Também eu oscilei, perante esta notícia, entre o gozo e a escândalização aberta. Mas quer uma quer outra reacção pressupõe ingenuidade ou pior, uma auto-ilusão piedosa. Sem gripe das aves e com gripe das aves, já fomos e continuamos a ser seleccionados todos os dias. Alguém não saberá isso? E discorda de que quem tem uma doença séria e os meios e não procura consultas e tratamentos privados tem falta de juizo ou de instinto de auto-preservação? Já lá vai muito tempo desde que podia dizer - e disse - isso com suave escârnio a outros bloggers que se levavam a sério. 10.3.06
Gottfried Helnwein: A morte de Pinocchio Pois é, Afonso, mas ninguém colocou em 1990 sequer a hipotese de adoptar este como hino da Alemanha reunificada, apesar da qualidade irrepreensivel tanto da música como da letra. Todavia é verdade que o Deutschlandlied também não é má, nem a música de Joseph Haydn (originalmente dedicada ao imperador austríaco), nem o texto de Hoffmann von Fallersleben, este frequentemente mal entendido, como aqui expliquei. 9.3.06
Ao Água Lisa 5 seguiu o Água Lisa 6, o que me levou a considerar de ocupar desde já o endereço do Água Lisa 7, e assim tentar assegurar que o João fique um pouco com a morada agora escolhida. Dois autores d'a.estrada:, o Rui Bebiano e o Tiago Barbosa Ribeiro voltaram a lançar blogues individuais, o Terceira Noite e o Kontratempos, respectivamente. O Tiago Mendes virou preto. Uma nova descoberta, o ad loca infecta, linkei logo, enquanto muitos outros blogues também excelentes continuam fora da minha lista. Um gajo não pode ler tudo. Faço muito questão de não ser daqueles que invocam, as escondidas ou abertamente, a falta de berço como fraqueza do novo Presidente da República. Não lhe faltará berço mas cultura geral, dirão estes, o que não deixa de ser uma meia verdade hipócrita. Claro que desejaria uma boa cultura geral num PR de qualquer país, mas se pondero a fraqueza de Cavaco Silva neste domínio contra o facto de que desta vez alguém chegou a este cargo quem não é da tradicional elite social, mando com o maior à-vontade a cultura geral às urtigas. Dito isto, acho natural e saudável que o novo Pesidente procura compensar o que lhe falta em bagagem filosófica e política fora das áreas em que se sente seguro, através da composição da sua equipa. O que me deixa então deprimido, é que concretiza este objectivo com a contratação do Diácono Remédios (anglicano, claro), João Carlos Espada! 8.3.06
Pai: Bom dia! Filho (6 anos): Ó pai, cortaste o cabelo! Pai: Cortei. É verdade, ontem não nos vímos, já estavas a dormir quando cheguei a casa. Como te correu o dia? Filho: Ontem estava feliz. A playmate da semana, sem nome, é de Didier Fibus. 6.3.06
No verão de 1986 passei férias com a minha namorada numa aldeia não muito longe de Oliveira do Hospital. Amigos que viviam em Lisboa, originalmente de lá, tinham nos emprestado a sua casa de férias, uma casa de arrendeiro recuperada. Era muito bonita, mas fazia-se lá pouco. Sem carro, dependiamos dos nossos pés, da camioneta que passava uma vez por dia e de ocasionais boleias. Um destes dias houve um arraial na aldeia ao lado, e lá fomos nós ver, a jovem professora de Lisboa e o seu namorado estrangeiro. O arraial estava montado no recreio da escola. O rectângulo de cimento, que se destinava à dança, estava vazio quando chegámos, mas a frente do edifício da escola havia um palco, em que uma banda da região estava a montar o seu equipamento: guitarras, orgão eléctrico e bateria. Ainda havia pouca gente, mas pessoas estavam a chegar, raparigas em grupo, a pé, rapazes e homens de bicicleta, alguns de mota de 50cc. Notei como o pessoal estava estranhamente distribuido. As mulheres e raparigas no lado esquerdo do recreio, os homens e os rapazes à direita, pelo que nós instalamo-nos um pouco a parte, entre os dois grupos, mas mais próximo do lado das mulheres. Por ser homem, fui eu buscar-nos, com as poucas palavras de português que comandava, duas cervejas no balcão que estava montado para este efeito. Finalmente a banda começou a tocar, música que uns anos mais tarde chamariam pimba. Pouco a pouco o terreiro começava a ocupar-se com casais a dançar, juntos, num tipo de dança de salão em versão rústica. Eram todos pares de raparigas. Ficou assim durante bastante tempo, só uma ou duas horas mais tarde, entretanto escurecera, a cena mudava. Enquanto os homens adultos se dedicavam com crescente intensidade aos copos e a conversa animada que não percebia, um e outro rapaz atreviam-se para o cimento e, sob os olhares atentos das mulheres mais velhas, tomavam os lugares duma das raparigas nos pares. A banda tocava agora “Live is life” de Opus, o grande hit do verão anterior. É verdade ON, já me declarei “liberal de esquerda”. Como castigo merecido para quem tem falta de pudor e juízo de auto-rotular-se, vens agora tu exigir-me a correspondente doutrina. Admito que não a tenho, e estou hoje mais seguro do que nunca que não procuro e não quero adoptar nenhuma. Adenda: Como o acaso quis, tropecei mesmo agora, no Bicho Carpinteiro, sobre um link em que se refere o tipo de liberais que tinha em mente. Nos EUA, não teria tido necessidade de acrescentar "de esquerda", pois "liberal" se explicaria naturalmente por contraste com a direita que se revê nas opiniões de Ann Coulter. Em Portugal porém esta tem fãs que curiosamente se chamam a si liberais. 4.3.06
Emil Nolde: Espírito Santo 3.3.06
Dois anos Povo de Bahá!
O Marco está de parabéns pelo seu blogue, que reflecte a sua personalidade inteligente, tolerante e exemplarmente humana. O assassinato da Gis foi um crime especialmente hediondo. Não é atenuante nenhuma o desvalor social da vítima. Menos ainda a sua fragilidade. O facto de que a vítima foi o que foi e que o crime foi cometido em grupo, por uma matilha, revolta-me especialmente. Como me repugna e assusta o grau da desumanidade que os autores do crime revelaram ao terem continuado durante dias as sevícias numa vítima indefesa e agoniante. Mas não tenho complacência pela ligeireza, pela preguiça moral de quem, como a Esther Mucznik, pretende enfrentar o horror deste crime em primeiro lugar com a confortavel condenação moral dos seus autores, pronto para empurrá-los junto com a sua culpa para fora do nosso espaço que chamamos sociedade. Não me alio a uma condenação que quer dizer: Quem comete um crime como este não pode ser dos nossos, por definição. Desde já não pode ter sido e agora muito menos poderá ser. Porque nos não fazemos coisas como esta. Somos diferentes, humanos. E antes de que nos assalta qualquer dúvida sobre isto, vamos nos indignar ainda um pouco mais. Acho sim um atenuante que estes jovens são menores. Outro que eles não tiveram uma família, mas viveram numa “instituição da solidariedade social”. Outro ainda que agiram em matilha. Como disse, este último facto enoja e revolta-me especialmente. Mas é um atenuante. Não conheço os jovens, as suas biografias, nem as Oficinas de São José, por isso o que direi agora só é um palpite que carece de verificação ou falsificação, mas é um palpite que se baseia um pouco na minha própria experiência, naquilo que vi e vivi como criança em ambientes sociais menos agraciadas pela sorte: O que estes rapazes fizeram à Gis, calculo eu, não foi uma coisa tão do outro mundo, quero dizer, tão fora do mundo deles. Não me admiraria nada se o seu quotidiano estava cheio de violência, de sevícias, de humilhações. Sexuais e outras. Neste caso o que fizeram à Gis só teria sido um prolongamento, uma ampliação daquilo que eles já sofreram e já fizeram uns aos outros. Embora que mais brutal, mais final, sem dúvida. Se este meu palpite for correcto, a culpa não pesa sozinha sobre estes rapazes de treze, catorze e dezasseis anos. (Também não só sobre a instituição em que vivem.) Mas é mais fácil deixá-los sozinhos com a sua culpa. E é mais que provável que vamos fazê-lo. Vamos abandoná-los a outras instituições da dessolidariedade social, só desta vez com grades. Não vamos matá-los, como eles mataram a Gis, mas vamos descartá-los como lixo, como eles a descartaram. Tiveram eles a ilusão que ao negar qualquer valor à sua vítima pudessem provar que lhes sobrava uma restia dele para eles. Claro que estavam duplamente enganados. (Isto é uma resposta ao António Machado, ao seu comentário ao post anterior.) Etiquetas: moral É preciso fechar as casas a que hipocritamente chamamos de abrigo e abrir as portas das nossas casas. A este respeito, lêem também os posts da Helena. Nas antípodas desta postura está o lamentável artigo de Esther Mucznik no Público de hoje, que acha importante realçar a maldade e o livre arbítrio dos jovens. 2.3.06
O amor de Jesus é genuinamente generoso. Ele ama-nos sem querer algo em troca. É isso que o distingue, muito pela positiva, do seu pai. Simplesmente delicioso! 1.3.06
Depois dum carnaval agitado, uma playmate calma. Overflow de Andrew Wyeth. Desta vez, depois de muito tempo, também com um contributo meu. A ouvir no player. O nosso vizinho era um padeiro precocemente reformado por causa de doênça cardíaca, que vivia com a mulher e a sua filha única de quinze anos, Marianne, numa bruta moradia ao lado da nossa. De acordo com a moda da altura tinha instalado uma sala de festas na cave. Esta sala consistia principalmente num bar, feito em madeira de pinho cujo aspecto rústico fora reforçado pelo seu recorte ornamental e pelo escurecimento artificial dado com uma chama de gás. Nas prateleiras do bar, em frente de espelhos e emoldurado por cortinados da mão da sua mulher, encontrava-se uma ampla selecção de bebidas espirituosas, iluminada indirectamente e a cores. O restante mobiliário limitava-se aos bancos a frente do bar e a uma mesa de café com algumas cadeiras, pois era necessário deixar algum espaço para a dança. Falta referir a aparelhagem de som e a peça príncipal da iluminação, um tubo de “luz negra”, que fazia, quando se apagava a restante iluminação, reluzir a roupa branca, efeito que realçava as camisas e os soutiens debaixo do vestiário de malha menos apertada. Como o pai da Marianne não podia usufruir da sua sala na cave com a frequência e intensidade como talvez quizesse, por causa da saúde, então via com bons olhos que a sua filha o fazia. Eu só tinha doze anos mas era alto, tinha cabelo comprido até aos ombros e um fato de ganga preto, o que me habilitava como convidado regular das festas que ela dava nos fins de semana para mim, outro rapaz da vizinhança ainda mais novo do que eu e as amigas da escola dela, estas já da sua idade. E assim, enquanto durante da semana rastejava no pinhal com a minha Kalashnikov fabricada a partir de um bocado de ripa, varão de cortinado e uma lata de tabaco (o magazine), a brincar a “guerra dos seis dias” com os meus amigos, no fim de semana aprendi na sala da Marianne a beber cerveja com palhinha, dançar o “blues apertado” e rodar a garrafa por beijos. E conheci músicas que não ouvia em casa: Middle of the Road: “Yellow Boomerang”, Slade: “Goodby to Jane”, Sweet: “Wig Wam Bam”, T.Rex: “Jeepster” e então “Back home” dos Golden Earring. Com instinto de que hoje ainda me orgulho apercebi-me que os últimos dois grupos eram bem superiores aos outros, e porque o erotismo demasiado explícito de Marc Bolan me assustava, foram os Golden Earring o primeiro grupo rock de que fiquei fã. Podia ter me saído pior. Muito bem, tirem-lá o homem do seu pedestal. Ignorava no entanto que este pedestal ainda existia, fora da Quinta da Atalaia. Já me tinham dito, mais do que uma vez, que terá sido um tipo desagradável, que não só cheirava mal como matava quem entendeu por bem matar, e achei plausível que foi. Não me dei ao trabalho de investigar as fontes, de recolher informação sobre a sua credibilidade para poder formar um juizo definitivo sobre isto. Mas não é preciso de empenhar-se agora a convencer-me que ele foi mesmo. Nunca acreditei neste santo, como não acredito em outros santos guerreiros. Sempre olhei quem vestia T-Shirts com o seu retrato ou a famosa boina com estrela, com condescendência. Como só posso olhar quem ostenta voluntariosamente o seu abandono do pensamento próprio, quem se orgulha do seu espírito gregário. Para evitar malentendidos: não é um sentimento diferente com que olho quem veste T-Shirts com o retrato de Churchill ou de João Paulo II, ou até de Mahatma Gandhi. Irrita-me porém a hipocrisia dos que se indignam moralmente com Che Guevara, mas não têm pejo em glorificar outras figuras históricas, como Churchill, por exemplo, que tal como este não hesitaram de massacrar inocentes em nome duma causa superior. Recomendo ler o que o Manuel Resende tem a dizer sobre isto! |
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