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30.11.04
que me deixou inicialmente apreensivo, é claramente uma transição do muito bom para o ainda melhor! Hoje leio lá: Também já não acredito no Pato Donald «Whatever the appeal of Disney's lands, as a political ethic it represents the tyranny of engineered happiness and consensus. It is undergirded by the fundamental notion that conflict disrupts the satisfaction of consumption and hence the constrution of identities through the purchase of yet more artifacts. Instead, conflict is essential to maintain a democratic society, which is why Disney's attempt to achieve cultural legitimacy through programmed versions of history and through architectural patronage is so troubling. By 1995, Disney controlled one of the biggest television networks in the United States, ABC, which would put major newscasts into its hands. Disney's linkage of freedom and free-market spreads into more realms while its architectural patronage reinforces its cultural image as benign and innocuous.» (Architecture After Modernism, Diane Ghirardo, 1996) _____________ P.S.: Não resisto, Lourenço: Bem-vindo ao clube! 29.11.04
O Capuchinho Preto corre em direcção à casa da avozinha, tropeça e rebola vale abaixo, embate numa árvore e perde as duas pernas. Continua a rebolar a grande velocidade, vai contra um pedregulho e perde os dois braços, rebola e rebola e rebola aceleradamente até esbarrar nas escadas da velha casa, a cabeça desprende-se do corpo e bate na porta que se abre. O olho salta fora da cabeça do Capuchinho Preto e voa em direcção à cama da avozinha que acorda sobressaltada: "ai! que horror, um bicho!". E esmaga o olho da neta na parede. (autor: Miguel Silva, ed.: Luis Carmelo no Miniscente) Mas sabe muitas coisas, esse homem:
"[...] Aliás sempre me irritou a palavra bebé, em particular para designar uma coisa como um governo, porque Bebé era um anão francês , de nome Nicholas Ferry, bobo do Rei Estanislau da Polónia e de que os franceses, com uma crueldade imensa, passaram a usar a alcunha para traumatizar as crianças." Rogier van der Weyeden: Jovem mulher ...quando repetida pela enesima vez. Continuo a lê-lo, mas já não me alegram ou divertem os ataques de JPP ao actual governo. Que tal se as pessoas sérias e competentes dentro do PSD formassem um movimento e se assumissem como alternativa interna? Esta Segunda-feira há uma nova Terra da Alegria!
28.11.04
Há quem me já falou do "prazer linguístico" na leitura do Quase em Português. E não acho que estava a troçar de mim. Pois é verdade: Há coxos, que se movem com uma certa graça... 27.11.04
Eu sei que não é bonito deleitar-me com críticas de livros que não li e nunca vou ler, mas até me convém contrariar um pouco a minha imagem de bom rapaz. Só não tinha linkado o Esplanar até hoje porque não quis ler ainda mais blogues com posts compridos... 26.11.04
No post Os límites da liberdade o Timshel responde ao meu post Tabú e preconceito 2, concordando que a moral não deve intervir no pensamento, mas em relação à discussão pública tem reservas: "Imaginemos que se chegava à conclusão que 99,9% dos homens azuis (para retomar o exemplo dado na Terra da Alegria) tinham comportamentos criminosos frequentes. Em que condições, por exemplo, tal devia ser comunicado pela imprensa? Devia tal dado ser ou não transmitido pela imprensa? Como? Quais as consequências? [...] o problema não está na discussão mas nas consequências da discussão. É que, por vezes, uma discussão constitui, objectivamente, uma decisão." O problema é real e sério. Mas há nenhuma instituição a qual acho aceitável atribuir o direito de decidir o que se investiga e discuta e o que não. No fim, esta acabaria sempre como o Ministério da Verdade de Orwell. Não há melhor defesa para a humanidade, nos dois sentidos do termo, do que confiar nos à sociedade plural, em que é possível o contraditório, e que dá espaço para defender o que é intocável, os direitos humanos, de cada humano, contra eventuais conclusões que as põem em causa. Caso contrário perdemos tudo, liberdade e razão. 25.11.04
"O presidente venezuelano, Hugo Chávez, recebeu ontem, em Trípoli, na Líbia, o Prémio Khadafi dos Direitos do Homem.[...]" Notícia na rúbrica "Pessoas", na última página do DN de hoje. (Link não disponível.) Ontem já fiz referência à Terra da Alegria, mas era em relação a um post específico no contexto da discussão do "tabú e preconceito" (ver post anteriores aqui). Só hoje tive tempo pare ler os outros posts da TdA. E isto leva-me a dize-lo com todas as letras: A Terra da Alegria é o melhor espaço do pensamento religioso que conheço! Não só na blogosfera, em geral. Em lado nenhum ouvi pessoas de ideias e crenças tão diversas expor de forma tão aberta e honesta, e com uma latitude temática e de registo tão grande, o que os move enquanto seres religiosos. Interessa-se pela religião? Pelo que ela é e faz, para lá dos rituais e dos dogmas, para pessoas concretas, cristãos e não-cristãos, até agnósticos? - Visite a Terra da Alegria! 24.11.04
Playmate da semana: Venus (Reynolds) No Terra da Alegria de hoje o Timshel comenta o meu post “tabú e preconceito”, que aqui escrevi anteontem. Nele afirmei - algo inconsequente - depois de ter demonstrado a necessidade histórica do tabú que suprime raciocínios que possam servir como reforço de preconceitos antisemitas, que mesmo assim não quero conformar-me com o tabú. No argumento central do post do Timshel na Terra da Alegria, que passo a citar, realço uma frase que condensa a questão do tabu e com a qual discordo: "[...]não tenho dúvidas que deve ser exactamente como um tabú que deve ser tratada a resposta a essa questão que traduza uma abordagem racista. É legítimo colocar a pergunta mas é moralmente ilegítimo dar determinadas respostas. Porque a razão aqui não é suficiente. Um tabú é uma barreira moral. O facto de ser uma barreira moral não deve impedir a sua discussão; bem pelo contrário (penso aliás que a parte final do post do Lutz visa, pelo seu carácter algo provocatório, provocar precisamente esta discussão bastante útil). Mas a resposta a dar não se pode basear apenas na razão.[...]" O que Timshel aqui propõe, por razões morais, é o que em alemão chamamos "Denkverbot" ("proibição de pensamento"). Da minha parte, acho proibições de pensamento, também por razões morais, altamente insalubre. Cercear o pensamento para excluir algumas respostas, aos quais ele podia eventualmente levar, à partida, é exactamente a carcterística do raciocínio ideológico - seja ele político ou religioso – que assegura antecipadamente o resultado, e que lhe retira, no meu entender, todo o crédito. O que aqui acontece é a mistura da razão com a moral. A razão não tem nem deve ter nada a ver com moral. A única moral que se aplica a razão é que ela cumpre as suas regras: a lógica. Parece-me que o Timshel, quando quer limitar o leque das respostas permitidas, está a temer conclusões que já incluam juizos de valor de cariz utilitarista, que efectivamente devem ser avaliados em termos morais. Mas essas conclusões já não pertencem a razão. Por exemplo: Nada devia impedir-me de fazer uma investigação estatística, e chegar a conclusão que certas categorias de pessoas (povos, raças, sexos) são mais aptos para determinadas tarefas do que outros, ou que tendem de cometer mais crimes. Não nego que este tipo de estudo pode servir de arma para racistas etc., e também não que é muito discutível a possibilidade de estabelecer categorias, sem que essas já sejam ideologicamente infectadas. Mas este problema pertence a outro plano. Como também aquele, quando começo, à partir do resultado da minha investigação, a estabelecer medidas direccionadas para estes grupos: Internamento preventivo do grupo potencialmente mais criminoso, exclusividade do acesso ao ensino superior ao grupo com maior incidência de inteligentes etc... Aqui estou naturalmente de acordo com o Timshel: A generalização é o que é imoral. A minha insistência na total liberdade do pensamento não deriva só duma postura de princípio - dum liberalismo radical neste domínio – mas também da minha convicção de que ela é a unica esperança de assegurar uma comunicabilidade supra- ou inter-ideológico. Porque atribuo o facto de que representantes de universos ideológicos diferentes simplesmente não se conseguem entender – mesmo se, o que por vezes acontece, mostram empenho e boa fé - exactamente a isto: aos campos de pensamento truncados por motivos ideológicos ("éticos", diria quem pensa dentro da ideologia...). 23.11.04
Eduardo Paolozzi: Forms on a bow 22.11.04
Ana Gomes, no Causa Nossa, descreve a nova comissária europeio para a concorrência, a holandesa Nelly Kroes, como uma mulher de negócios ocultos e com ligações à indústria do armamento, os que “esqueceu” mencionar na sua candidatura. E faz a seguir a essa apreciação uma especulação sobre a sua possível ascendência judia, partindo da semelhança do nome Kroes ao nome Cruz, e do facto histórico de muitos judeus portugueses se refugiaram, no século 16. na Holanda. Filipe Nunes Vicente (Mar Salgado) e José Flávio Teixeira (Ma-Schamba) indignaram se perante esta, como eles entendem, manifestação de preconceito (antisemita, claro, embora a palavra antisemita não foi utilizada nas críticas). André Belo (Barnabé), Luis Águiar Conraria (no comentário ao post do FNV) e agora Vital Moreira no Causa Nossa sairam em defesa de Ana Gomes. Acho que, em relação ao conteudo do post de Ana Gomes, se podem constatar sem equívocos dois factos: 1. A descrição genérica de Nelly Kroes como mulher de negócios obscuros e comportamento eticamente duvidoso (pois oculta as suas ligações a uma empresa de armamento). 2. O relacionamento da condição de mulher de negócios de sucesso com o suposto facto de ser judia. Se considero o post antisemita ou não, depende da apreciação se o post possibilita, convida ou até obriga a estabelecer o nexo entre estas três afirmações: - mulher de negócios duvidosos e com poucos escrúpulos - mulher de negócios bem sucedida - judia Enquanto acho que significaria fazer um processo de intenção afirmar que a autora do post quis estabelecer o nexo entre as três afirmações, parece-me indiscutível que o post possibilita esta leitura e serve assim objectivamente como argumento de reforço para qualquer leitor que já tem o preconceito de judeus como homens de negócios desonestos. E que destes leitores há, e muitos, certamente a Ana Gomes sabe. E daí acho o post – no mínimo - irresponsável. Mas por outro lado incomoda-me o tabú que existe em relação a toda a atribuição de características genéricas em relação aos judeus em especial e para qualquer etnia em geral. Cresci numa sociedade em que este tabú era – por boas razões – quase absoluto. Exactamente por causa do efeito acima descrito. Uma afirmação podia até ser ingénua, mas serviria na mesma como reforço de convicções e preconceitos cuja existência estava mais que comprovada e cujos efeitos foram dum insuperável horror. Por isso, o tabú existia – e existe – por duas razões: para evitar qualquer faísca que pudesse fazer ressuscitar o fogo do antisemitismo desenfreado, e por respeito pelos sentimentos dos sobreviventes do shoá, que compreensívelmente – não: muito justamente! - estavam e estão hipersensibilizados a este respeito. Só um tabú não é uma solução. O tabú suprime o problema, por algum tempo, mas não o resolve. Um tabú não convence quem devia ser convencido. Como crente na razão não acredito que se pode proibir pensar e discutir livremente questões como esta que a Ana Gomes insinuou ou pressupôs: Os judeus são melhores homens/mulheres de negócios? É ilegítimo colocar esta pergunta? É legítimo chegar a uma resposta para essa pergunta, seja qual for? A este propósito lembro me dum senhor (português), que numa conversa comigo se assumiu com o maior desassombro como racista. O seu exemplo era exactamente o povo judeu: Não vê qualquer pessoa excepto de quem não quer que ele é o povo mais inteligente do mundo? E comecou a citar me o elenco interminável das grandes figuras das ciências e da arte mundial, que eram e são judeus. E não basta assistir a quaisquer jogos olímpicos para confirmar que os negros são melhores atletas do que os brancos? Para ele, racista era qualquer pessoa que usava a o conceito da raça para categorizar os homens. Nada contra a sua definição. A questão é se nos podemos permitir-nos uma antropologia com este tipo de categorias: "Os judeus", "os arabes", "os alemães"... Faço o exercício com a afirmação implícita de Ana Gomes: "Os judeus são melhores homens/mulheres de negócios." Sabemos que entre os homens/mulheres de negócios de sucesso há homens e mulheres manhosos, desonestos, sem escrúpulos. Daí conclui-se facilmente, se aceitamos que existe uma predilecção dos judeus para os negócios, também a existe para os negócios obscuros. Ergo podiamos afirmar: Os judeus são os melhores homens/mulheres de negócios obscuros. Bem. Esta frase põe-me – e penso que não só a mim - os cabelos em pé. Porquê? Claro que é a descontextualização que subverte tudo. Mas sabemos como é tão fácil descontextualizar, que se descontextualiza todos os dias, que é de contar com estas descontextualizações, nomeadamente se sabemos que já existe um preconceito que as motiva. E isso sabemos: Esta ideia já serviu para preparar o caminho para os campos de extermínio. Não me agrada como defensor de liberdade das ideias e da expressão, mas tenho de admitir que há uma realidade histórica que condiciona estes raciocínios, queiramos quer não queiramos. Mas mesmo assim não quero conformar-me com a solução do tabú. 21.11.04
Muito oportuno e pertinente é este post de Carlos Manuel Castro do Tugir. Não podemos fechar as fronteiras de Europa para os imigrantes, por várias razões: práticas, políticas e éticas. Mesmo se o fizessemos, já seria, há muito, tarde demais. Podemos não gostar a cultura deles, e eles não da nossa, mas estamos condenados a construir com eles, uma cidadania comum. Se não conseguirmos estabelecer um common ground da convivência, correspondente ao físico que já partilhamos, teremos o desastre. "Outros que não eu teriam falado de 'raízes'... Não emprego esse vocabulário. Não gosto de raízes e da imagem ainda menos. As raízes enfiam-se na terra, contorcem-se na lama, crescem nas trevas, mantêm a árvore cativo desde o seu nascimento e alimentam-na graças a uma chantagem. 'Se te libertas, morres!' As árvores têm se de resignar, precisam das suas raízes; os homens não. Respiramos a luz, cobiçamos o céu e quando nos metemos na terra é para apodrecer." (Amin Maalouf) Este citado do seu novo livro "Origens", serve como introdução para a sua entrevista na Pública de hoje. Indispensável! 19.11.04
Andrew Wyeth: Blue door
(act.)
Vá lá, José, a tua "deficiência", podia ter te calhado pior. Na poesia, como nas artes, pode distinguir-se entre mensageiros e artesãos. Os mensageiros são os que, antes de tudo, têm algo a comunicar e se servem da poesia, da arte, como meio, e creio eu, muitas vezes responderiam, se lhes fizessemos a pergunta, que usam o meio à falta de melhor. Os artesãos por sua vez estão em primeiro lugar interessados no seu ofício, em fazer bem-feito, fazer arte. Os poetas referidos pertencem todos à categoria dos mensageiros, que para além disso, dominam o seu ofício num elevadissimo grau. Serem mensageiros não implica que tenham desinteresse no ou falta de savoir-faire. O savoir-faire de Rilke, por exemplo é, até hoje, inultrapassado. Mas a sua arte está ao serviço do que realmente importa. É verdade que, nestes casos, a arte não está dissociável da mensagem, que as coisas se fundem num só, mesmo assim digo, a diferença está na urgência de comunicar algo que já existiu antes da arte. Talvez a tua "incompreensão" tem essa razão: uma noção de futilidade na poesia artesanal. Não tenho nada contra artesãos, apesar de, para dizer a verdade, na poesia só me interessam os mensageiros. Talvez porque a poesia não é o meu ofício. Já na arquitectura é diferente: como é o meu metier, o savoir-faire dos colegas interessa-me muito. Diz um arquitecto que se sabe, na maioria dos casos, artesão. Etiquetas: sel 18.11.04
17.11.04
Os óbitos dos blogues começam a abundar, de blogues que nasceram na altura em que nasceu tambem o Quase em Português. Já me sinto como o velho que, assistindo aos funerais cada vez mais frequentes da sua geração, se interroga melancolicamente, mas já quase conformado, sobre quando será a sua vez. Desta vez o enterro foi o da Classe Média. Atiro a minha pá de terra, e digo o meu adeus. Fica a consolação que, ao contrário do que acontece na vida não-virtual, aqui já se assistiu a ressureições e reincarnações. Playmates da semana: Meninas no banho (Renoir) Que viva esta Terra!
16.11.04
Terras do Nunca até nunca?
Quem diria que as Terras do Nunca estão afinal tão assentes na nossa terra de todos os dias, que seja possível tirar-lhes, literalmente, o tapete. Pelo menos é isso o que o Pula Pula Pulga pensa, e o que me parece altamente plausível. Sempre achei que a minha profissão de arquitecto fosse uma em que era o mais difícil conciliar independência, frontalidade e honestidade intelectual com a necessidade de sustentar a vida. Vejo que ser jornalista é ainda mais complicado. O Pula Pula Pulga explica no caso do JMF os benefícios do anonimato nos blogues. Postas as coisas assim, não encontro argumentos contra isso. Mas essa conclusão deixa me com um profundo desgosto: Tenho aqui uma noção talvéz sentimental e antiquada da dignidade e da cidadania, que me leva a teimar num mundo em que um político possa ir ao cinéma, como qualquer um e sem aparato de segurança, um realizador polémico possa ir de bicicleta ao trabalho, sem serem abatidos, e ainda mais um cidadão possa escrever e subscrever com o seu nome o que lhe vem na alma, sem que isso lhe ponha em risco a existência profissional. Alguém perguntou ao Sr. K., se existia um deus. Sr. K. disse: "Aconselho-te reflectir se o teu comportamento se alterava, devido a resposta a essa pergunta. Se não se alterava, podemos deixar cair a pergunta. Se ele se alterava, posso ajudar-te ainda até este ponto, em que posso dizer-te, que já te decidiste: Tu precisas dum deus." (Bertolt Brecht) 15.11.04
14.11.04
Pieter de Hooch: Mãe O que confere a magia aos espaços de de Hooch: as fronteiras. Entre o espaço que se vê e o que não se vê no quadro. 13.11.04
...pergunto-me como é possível, que uma cidade, em que nasceu a Escola do Porto, referência mundial para uma arquitectura depurada, também deu ao mundo a Francesinha. a todos que assinalaram o aniversário do Quase em Português no seu blogue, felicitaram-me na caixa dos comentários ou via e-mail (act.): a bordo (Fernando Macedo); Adufe (Rui M.C.Branco); alerta amarelo (Afonso Cruz); Briteiros (J.A. Martins); Cibertúlia (Marujo); Desnorte; Guia dos Perplexos (José); Ma-Schamba (José Flávio Pimentel Teixeira); Pula Pula Pulga; Quartzo Feldspato e Mica (Rui Amaral e Manuel Resende); Rua da Judiaria (Nuno Guerreiro); Seta despedida (Alexandra Barreto); Tugir (Luis Novaes Tito); Um pouco mais de azul (1poucomais) Bruno Martins (Avatares); Carlos Cunha (Particulas Elementares); Cecília (Errante); hfm (Linha de cabotagem); João Carvalho Fernandes (Fumaças); João Oliveira Santos (Ouvido pensante); Lourenço (Complexidade e Contradição); Luis (Portugalidades); Marco Oliveira (Povo de Bahá); Miguel (Bar do Moe); Miguel Silva (Viva Espanha); polaroid android (hardblog); Ricardo Carvalho; Sara Monteiro; Zé Filipe (Enchamos tudo de futuros) Sabe bem o vosso apreço! 11.11.04
Como argumento contra a "indignação de muito ímpio com aquilo em que um cristão é capaz de acreditar", o Tiago de Oliveira Cavaco apresenta um exemplo: "Por volta dos 18 anos fui a um concerto dos Pearl Jam. Entre uns quantos milhares de pessoas não vi uma única de origem africana. Se seguir à risca os pruridos racionalistas dos sacerdotes objectivos devo concluir que Eddie Vedder não gosta de pretos? Porque o intelectual nunca viu um milagre no caminho que faz diariamente da sua casa na Graça para o S. Luiz no Chiado isso significa que toda a Lisboa está vedada a anjos?" Não, não significa. Não é o facto de eu não ver as provas que não apresenta, que invalida as suas crenças. Nada invalida as suas crenças. O que acontece é que elas ficam algo relativizadas, pois se me apresentam a concorrer com tantas outras, sejam elas referentes a homemzinhos verdes, à reincarnação como minhoca ou à pomada milagrosa que cura calvice. Em face de tanta oferta, há quem se refugia na plausibilidade... Etiquetas: sel 10.11.04
Já que estou a desenterrar memórias antigas de Berlim, parece-me a Nina Hagen muito apropriada como Playmate da semana. Não só uma ícone da (contra-)cultura berlinenese dos anos '80, ela, que nasceu em Berlim oriental e acompanhou o seu padrasto, o cantor e poeta Wolf Biermann, quando este foi expulso da RDA em 1976, na mudança para o ocidente, representa com a sua biografia as duas Alemanhas e o conflito entre elas. No verão de 1989 chegámos, um jovem casal com um bebé de seis semanas, vindos de Portugal, a nossa casa extraordinária na ilha Lohmühleninsel em Berlim Kreuzberg. Como o último dente na boca duma velha, o prédio estreito, de quatro pisos e três fogos, erguia-se, entre terrenos baldios e barracas, no beco sem saida que era o Schleusenufer, a única rua da ilha. Dois dos nossos três quartos davam para a rua, que do outro lado não tinha prédios, mas o canal e a eclusa que deu à rua o nome. A ilha era o resultado da bifurcação do Landwehrkanal, que aqui entrava no rio Spree. Um canal estreito, mas nevegável, embora que desde a construção do muro sem tráfego. No outro lado da eclusa, por de trás duma fila de plátanos majestosas, havia uma típica fábrica berlinense, um prédio sólido e comprido de tijolo, com janelas altas e pé-direitos elevados, que estava semi-abandonada: uma ou outra empresa tinha aqui um gabinete, para poder tirar proveito de benefícios fiscais por estar sediada em Berlim ocidental. De resto, os espaços ou estavam fechados, ou - alguns poucos - aproveitados como lofts. A casa da eclusa contrastava com este fundo: fingindo ser uma moradia, com telhado de duas águas muito inclinadas, situava-se mesmo na margem do canal, por detrás da vedação em rede que separava a eclusa da terra firme de Berlim ocidental. Pois ambas as margens da Spree e também desta parte do canal, eram território da RDA. O guarda da eclusa era assim, tal como os motoristas da S-Bahn que embora circulando em Berlim ocidental, também estava sob a administração da RDA, uma pessoa de especial confiança do regime. Porque seria uma brincadeira para ele, se quisesse, em vez de voltar, todos os dias, no barco para o lado comunista, trepar a rede e fugir. Nem a torre de vigia, que se erguia como um farol macabro uns cinquenta metros em frente nas águas da Spree, seria um problema para ele. O outro lado, esse encontrava-se para lá do rio. Aqui, na Spree, não havia muro. Não era necessário. Para além da torre, bastavam as redes na água, os barcos patrulha e os fortes holofotes, que iluminavam toda a envolvente durante a noite, e que faziam com que eu, em todos os meses que vivia nesta casa, nunca dormi no escuro. O outro lado também ficava nas traseiras da nossa casa. O segundo ramo do canal passava a uns trinta metros por detrás do nosso prédio, e este era suficientemente estreito para justificar o muro no lado de lá da água. Por detrás dele, outro prédio, outra fábrica abandonada. Mas em cima do telhado dela estava montada uma galeria metálica, na qual patrulhavam os polícias de fronteira da RDA, os Kalashnikov sempre debaixo do braço. Era sob os seus olhares que tomávamos os nossos pequenos almoços na cozinha. No início uma pessoa podia achar este cenário perverso e incomodativo, mas na verdade a zona tinha um encanto muito próprio, um charme de fim do mundo. A Lohmühleninsel era, no sentido mais literal, um idílio a sombra do muro. Alí até se pescava, com calma, mesmo na margem do canal pertencente à RDA, protegido pelo próprio muro da vista dos guardas. E enquanto Kreuzberg na estação U-Bahn Kottbusser Tor ainda fervilhava de vida, com a sua fauna multi-cultural, de turcos, curdos, punks, estudantes, velhos berlinenses e activistas das varias seitas da extrema esquerda, aqui, mais em frente, descia-se da estação terminal Schlesisches Tor já num ambiente muito mais sossegado; e quem passava pelo Bonjour Tristesse de Siza Vieira e percorria a Schlesische Strasse no seu último quilómetro até ela esbarrar no muro, sentia à cada passo a crescente solidão. Já não havia mais pubs, nem sequer snack-bares turcos com Döner Kebap, nem lojas - só quase no fim, o quiosque que vendia cerveja de garrafa e vodka em frente do asilo dos sem-abrigo. A seguir veio a ilha, e quem virava à esquerda antes da bomba de gasolina abandonada, estava na nossa rua. Nos fins de semana, vieram aqui os turcos fazer pique-nique, abriam as portas dos seus velhos Ford Escort e Golf e inundavam este lugar com a sua música pop oriental. Nas noites dos dias úteis, menos barulhentos, vieram para o mesmo local as prostitutas nos carros dos seus clientes, para fazer, em dez minutos, o serviço, e ir se embora logo a seguir. Três ou quatro dias antes do 9. de Novembro estava sozinho em casa quando vi uma coisa insólita: Um rebocador, mais precisamente „empurrador“ de batelão amarrado a nossa ilha. Vi um homem com óbvio nervosismo trepar a vedação da eclusa. No meio do rio, um batelão abandonado à deriva. Mais tarde pude observar da minha janela como um barco da guarda da fronteira da RDA conseguiu apanhar o batelão antes de este chocar com a margem. Não sei por que razão, mas quando vi o homem nervoso não percebi logo o que se estava a passar e não me lembrei de olhar para a torre de vigia. Da casa da eclusa, não se via reacção alguma. Foi a única fuga a qual assisti. Não houve tiros. À parte desta história, tudo que sabia e sentia da agitação em que se encontrava a RDA vinha, como para todos os outros, da televisão: o quadragésimo aniversário da RDA, a visita de Gorbatchov, as manifestações de Segunda-feira em Leipzig, as fugas em massa da Hungria para a Austria, o drama emocionante na embaixada alemã de Praga. Eram tempos em que era animador ver o notíciário, mas tinha outras prioridades. Estava na recta final do meu trabalho de fim do curso, que devia entregar na terça-feira, 14 de Novembro. Na quinta-feira, 9 de Novembro, as 10h00 da noite, decidi terminar o trabalho por este dia. Os amigos, que ajudavam nos desenhos finais, já se tinham ido embora para jantar. O bebé estava com os meus pais em Westdeutschland e a Margarida fora mostrar os bares in de Kreuzberg a uma amiga que estava de visita de Portugal. Liguei a TV. Um reporter na rua, em frente da Oberbaumbrücke, falava excitadamente. “Aqui ainda está tudo calmo, vamos então mudar para o colega na Bernauer Strasse, parece que lá já estão a chegar os primeiros compatriotas...” Peguei no meu casaco e fui para a rua. A Oberbaumbrücke era aqui ao lado. Ela era a ponte na qual o U-Bahn antigamente atravessava a Spree, logo a seguir a estação Schlesisches Tor. Desde a guerra, a ponte estava fechada e até os carris desmantelados. Usava-se, sim, como ponto de travessia exclusiva para soldados das quatro forças aliadas. Comigo aguardavam lá talvez uma dúzia de berlinenses ocidentais a chegada dos primeiros que vieram do leste. Não demorou muito. Lembro me da atmosfera irreal e da enorme calma, em que tudo isso se passou, no nosso lado, nestas primeiras horas. E lembro me ter ficado impressionado pela extraordinária juventude dos visitantes. Um rapaz e uma rapariga, seguramente não com mais do que 16 anos, aproximavam-se da linha branca, que demarcava a margem do rio - oficialmente RDA - do território ocidental. Havia aqui as famosas placas: „Atention! You are Leaving the American Sector!“ Antes da linha, paravam, e deram, de mãos dadas, o passo em simultâneo. As imagens desta noite e do dia seguinte, no Brandenburger Tor, no Tiergarten, no Kurfürstendamm, são conhecidas. Na minha ilha não se sentia ainda muita diferença. Isto só mudou no Sábado, quando veio uma auto-grua do lado da RDA e abriu uma fresta no muro onde ela atravessava a Schlesische Strasse. E o nosso mundo abandonado tornou-se preto de gente. Neste dia, tinha de ir para o centro da cidade ocidental, e demorei quase três horas para os 12 quilómetros. Não havia maneira de deslocar-se de carro, nas entradas do U-Bahn as filas chegaram a ter centenas de metros, e a minha decisão de ir de bicicleta revelou-se uma má ideia. Era mais um obstáculo que tive de empurrar, durante quase todo o percurso, no mar de pessoas. Durante todos estes dias havia um ambiente de festa, um sentimento generalizado de solidariedade e de enorme esperança. Mas não tardou muito que se fez notar o espírito empreendedor. Os primeiros que o revelavam eram os turcos que, compreensivelmente, estavam menos emocionados. Depois de o governo da RFA ter começado a distribuir, através dos correios e agências bancárias o „Dinheiro das Boas-Vindas“ (ca. de 10 contos para quem aceitava um carimbo no seu BI da RDA), na minha Schlesische Strasse, onde nem lojas havia, alinhavam stands improvisados que vendiam bananas, pastilhas elásticas e latas de Coca Cola morna aos novos visitantes. Demorou ainda umas semanas até os berlinenses ocidentais começavam a perder a paciência com o facto de já não haver lugares sentados no metro, e em vez disso filas de espera e prateleiras vazias nos supermercados. E que apareceu o primeiro T-Shirt que dizia, em berlinense: „Ick will meene Mauer wiederhaam!“ O que é em português: „Quero o meu muro de volta!“ A Terra da Alegria, fertil e vigorosa!
Egocentricamente concluindo da minha própria falta de contributo (por falta de tempo e de de inspiração) cheguei a temer que a Terra da Alegria comecasse, pouco a pouco, a definhar. Mas não é nada verdade! 9.11.04
"Logo que o decurso dos acontecimentos desta noite permite o destacamento dos oficiais para isso, deve prender-se em todos os distritos tantos judeus - nomeadamente abastados - como é possivel alojar nas prisões para isso preparadas. No início, só se deve prender Judeus saudáveis, de sexo masculino e não demasiado velhos. Depois da conclusão da prisão deve imedatamente ser estabelecido o contacto com os respectivos campos de concentração para a transeferência mais rápida possível para eles." (Reinhard Heydrich: Telex do 9.11.38) Na "Reichskristallnacht" o poder Nazi organizou um pogrom contra os Judeus a escala nacional, incendiando e destruindo sinagogas, assaltando lojas judias e prendendo arbitráriamente milhares de judeus para deportá-los para os campos de concentração. O NSDAP esforçou-se de dar a esta acção o aspecto dum surto espontáneo de "justa raiva popular", mas era uma acção minuciosamente planeada e organizada. O "povo", quer dizer o mob, eram, na verdade, membros do partido disfarçados de civís. A Kristallnacht foi um marco na escalada da perseguição antisemita na Alemanha Nazi, e um teste importante para ver em que medida a população comum tolerava ou até participava na violência aberta contra os Judeus. Ela não participou, mas não se mexeu. A partir daí, os assassinos sabiam que podiam contar com a cobardia do povo. _______________ Exactamente 51 anos depois, caiu o muro de Berlim. Por coincidir esta data com a Kristallnacht, hoje não é o dia 9 de Novembro feriado nacional, mas o incomparavelmente menos emocionante dia da assinatura do tratado da reunificação, o 3 de Outubro. Etiquetas: alemanha, antisemitismo, cidadania, sel 8.11.04
7.11.04
Quem me conhece, sabe que detesto praia. Mas não é verdade. Detesto estar na praia no verão, exposto ao sol e fritar no meu suor panado de areia. Estar na praia é maravilhoso quando ela está vazia. Hoje não estava vazia, mas - mesmo assim - suficentemente pouco povoada. Quase como a conheço (a praia holandesa) dos dias da minha infância. Só então era uma praia sem lixo... 5.11.04
Tadao Ando: Water Temple Acho inquestionável que Arafat era um homem de estado, um "grande homem", mais ainda se temos em conta a dimensão do seu povo. (Queria aqui acrescentar mais uma frase, mas não: não é preciso relativizar o que acima escrevi...) Foi reconfortante a leitura que hoje fiz do Blogo...Existo. Ando desde Quarta-feira deprimido e desorientado por causa da escolha dos eleitores americanos. Não é que agora percebi tudo, mas foi o encorajamento necessário para assumir me finalmente como o intelectual arrogoante e efeminado que sou. E para não esconder mais o meu antiamericanismo - perdão: antiamericanismo primário. (Quase esqueci completar o termo com o adjectivo associado.) De vários posts sobre os EUA, cito aqui este na íntegra: Eu diria mais Robert Kagan popularizou a infeliz expressão: «Os americanos são de Marte, os europeus são de Vénus», uma maneira socialmente aceitável de um académico insinuar que os americanos os têm no sítio, ao passo que os europeus não passam de um bando de efeminados assustadiços. Timothy Garton Ash, citado no O País Relativo, acha mais correcto afirmar-se que os Republicanos são de Marte, ao passo que os Democratas são de Vénus, notando de passagem que há mais semelhanças entre Democratas e europeus do que entre Democratas e Republicanos. Olhando para o mapa eleitoral americano, eu diria antes que os labregos são de Marte e que os alfabetizados são de Vénus. Também temos muitos labregos cá na Europa (alguns até andaram recentemente envolvidos em guerras civis sanguinárias), só que ultimamente (lagarto, lagarto!) temos conseguidos mantê-los afastados do poder num bom número de países. _____________ P.S.: Há umas semanas, o Blogo...Existo elogiou o Quase em Português como "melhor blogue da gajas da actualidade", que - admito - me soube muito bem. Agora resolveu fazer-lhe concorrência. Estou preocupado. 4.11.04
Segundo o Blasfémias abre-se uma janela de oportunidade. Prevê-se, aparentemente, que agora possa acontecer o seguinte: Os Palestinianos irão eleger um líder moderado, honesto, competente e largamente respeitado pelos seus compatriotas. Ele terá autoridade para travar a actuação assassina do Hamas, da Jihad Islámica e dos demais grupos terroristas. Sharon, por sua vez, consciente da oportunidade, acelera o desmantelamento dos colonatos em Gaza e prepara um vasto programa de desmantelamento de colonatos nas restantes áreas ocupadas. Para esta política conseguirá obter o apoio generalizado não só do partido do trabalho como do seu próprio. Os milhares de colonos, muitos deles immigrantes recem-chegados a Israel, contentar-se-ão com a perda dos seus lares, a favor do paz alcançado. O re-eleito presidente dos EUA assume-se como árbitro no novo processo de paz e será anfitrião e padrinho das negociações que finalmente chegam a estabelecer as condições mutuamente aceites para uma coexistência pacífica. Jerusalem ou continuará como capital de Israel, mas aberta para os palestinianos e demais muçulmanos que pretendem visitar e gerir os lugares sagrados da sua religião, ou será uma cidade com estatuto especial, gerido por um conselho israelo-palestiniano sob a tutela duma entidade neutra, como os Estados Unidos ou a ONU. Tomara que Deus oiça, desta vez, o Blasfemo CAA. Mas para ser sincero: não creio. * (ainda falta a confirmação oficial) 3.11.04
"América é diferente. America é um país conservador, e países assim conservadores não mudam os seus presidentes em tempos de crise. Por isso foi concedido ao George W. Bush um segundo mandato. A vitória - no fim - surpreendentemente clara traz consigo um grande Embora: Embora que conduziu, pelas razões erradas, no tempo errado, a guerra errada com a estratégia errada. Embora que o seu enorme défice orçamental, em conjunto com as suas reduções generosas de imposto, preocupa os leigos interessados, ou seja os cidadãos, mais do que os especialistas." (Gerhard Spörl em Der Spiegel) Admito, ainda assim: I don't get it. Percebo que uma escolha dum Presidente não é, necessáriamente, uma escolha racional, de câlculo frio em função do interesse. De facto, não consigo vislumbrar uma razão racional, porque a maioria dos Americanos podia ter votado em Bush. E penso mesmo que não era por razões racionais que votaram nele. Votaram em Bush porque confiaram mais nele. Mas porque confiaram mais nele, é que compreendo ainda menos. Playmates da semana: Bacantes (Pompeii) 2.11.04
é a receita de Pacheco Pereira para o Iraque e a razão porque votaria em Bush. Curiosamente, o mais do mesmo é uma receita muito popular perante o insucesso, embora que a experiência e a inteligência deviam sugerir exactamente o contrário. Theo van Gogh foi assassinado, ao que parece, por ter realizado o filme Submission, que tem como tema a violência contra mulheres na cultura islámica. É preciso ter coragem, o que é mais difícil agora... Mas é preciso ter coragem. 1.11.04
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