<$BlogRSDUrl$>




  • 31.5.08
    Flores de estufa

    quem se indigna com a linguagem mais plástica usada pelo Francisco Louçã no Parlamento. Eu não. Se houvesse mais desta linguagem, os debates estariam um pouco menos enfadonhas. Claro que as ofensas teriam que ter nível, e aqui estarei provavelmente a pedir demais.

    Lá na Alemanha, os partidos de todas as cores, não só da esquerda, orgulham-se dos seus oradores mal comportados, e estimam os dos adversários. O campeão incontestado ainda é Herbert Wehner (SPD), seguido de F.J. Strauss (CSU), Helmut Schmidt (SPD), Joschka Fischer (Grüne) e outros.
    Aqui uma tirada de Helmut Schmidt:

    «Acredito, Sr. colega Engelhard, que, desde o tempo em que o Imperador Calígula nomeou consul o seu cavalo, você é o erro de casting mais clássico num cargo público e político. A comparação está errada também porque o garanhão de Calígula teve bem mais temperamento e coragem.»
    Amy em Lisboa

    A rapariga não devia andar de saltos altos. Não sabe. Talvez sabe quando está sóbria, embora duvido. Há mulheres que andam de saltos altos a vida toda, sem jamais o aprender: nunca deixam de dar a noção ao observador que estão a balançar num equilíbrio precário. Aqui não é só a noção, é o caso, mesmo. Esta rapariga franzina de cabeleira enorme e com estas pernas magras não se mexe muito seguro no Palco do Mundo.
    Vê-se que hoje também não se entende com o equipamento. O microfone está alto de mais, não, agora está demasiado baixo. Solta-o, quer repô-lo, mas então a maldita coisa não quer voltar a prender no pé. A guitarra - enfia com dificuldade o cinto da guitarra no ombro - porquê é que a peça faz nenhum som? Ah, não está ligada à PA. Ora, vem um rapaz e tenta pôr o cabo. Quando consegue, já é tarde. Paciência.
    É verdade que também a voz não está grande coisa hoje, para isso pode-se pedir desculpa. O público entende. O que vale é que os rapazes da banda são bons profissionais, aguentam as confusões todas.
    Está sempre a mexer no vestido. Parece que está desconfortável, embora o vestido está largo, até muito largo no decote para o peito que tem. Puxa a bainha da saia para cima, já pela quarta vez. Ah, está a coçar-se! Entre as pernas. Também mexe no decote, outra vez. O que é que ela tirou de lá? Algo de comer? Será que vai cantar de boca cheia? Essa mancha é chocolate? Não, uma tatuagem. Talvez não vi bem. Em todo o caso, há coisas que ainda continuam enfiados no decote, como aquele lenço preto que está meio a sair acima do peito esquerdo. Tudo isso é um pouco obsceno, um pouco indecente, mas não, não é para provocar, não é para seduzir. Não é mesmo calculado, muito pelo contrário. Por outro lado, aquilo não a parece embaraçar.
    Entretanto vai-se na quarta canção. Depois um cover: A Message to You, Rudy, dos Specials. Há muito que já o não ouvi. Tem um belo groove: ideal para continuar no fundo enquanto se apresenta a banda. Amy começa pelo saxofonista, o músico mais a direita. - «ta-ta-ta-ta ta-taaa - A Message to You, Rudy» - A canção acabou. Esqueceu-se de apresentar os outros. Não faz mal.
    Agora acocora-se atrás de uma coluna do palco. O que está lá a fazer? Xixi? Não, reaparece com um copo de vinho. Parece Fanta, o que há no copo. Ainda tropece mesmo, os membros da banda ajudam-na a levantar-se. No fim, pede desculpas, diz que devia ter cancelado mas que adorou ter estado aqui, apesar de ter uma «bad voice» hoje. Já o disse antes. Explica que tem de acabar já, não há mais tempo, porque começou atrasada. Soa como achasse que era bem feito assim, o castigo justo. Para ela. E para o público? Mas que adorou. E ainda vai tocar o Lenny Kravitz.

    Um desastre de concerto. Curto, caótico, sem voz, sem garra. Mas o público perdoa. E eu também. Ela é destes raros artistas que mesmo no fracasso, no desleixo imperdoável aos mortais, ainda nos deixam algo que é dos deuses. Sou novo de mais para ter visto a Janis, o Jimi Hendrix, o Jim Morrison, calhou que nunca vi o Kurt Cobain. Vi a Amy Winehouse. Ela tem 24. Vamos ver se se safa. Não aposto alto. Mas nem todos que os deuses amam têm de morrer cedo. Talvez daqui a trinta anos poderá dizer o que Jimmy Page disse: «Sabia que a nossa música iria durar, mas não pensava que eu ia durar. Primeiro achei que estaria morto aos trinta, depois aos quarenta, entretanto tenho cinquenta e cinco e ainda ando por aqui.»
    28.5.08
    Já não "mortos a paulada, cobertos de silêncio de morte"



    Este filme é exibido no novo monumento em memóriam dos homossexuais perseguidos e mortos no tempo nazi, que há dias foi inaugurado em Berlim. Como a Helena bem refere, este monumento tem um defeito, por transmitir a falsa ideia de que a perseguição dos homossexuais na Alemanha terminou com o colapso do Terceiro Reich. Nada mais errado. A lei que criminalizou os homens homossexuais só foi abolida em 1969. Desde então muito mudou. Nos anos '80, um general alemão ainda foi demitido por ser supostamente homossexual (e reabilitado mais tarde, quando se provou que não era). Mas hoje os Presidentes de Câmara de Hamburgo (CDU) e de Berlim (SPD) são homossexuais assumidos e foram reeleitos como tais, bem como o líder do partido liberal (FDP). Ou seja, entretanto homossexuais fazem parte da vida pública alemã, também fora do mundo das artes. Mesmo assim, até se possa acrescentar, com toda a normalidade, ainda fica um caminho por percorrer.

    Vale a pena ler o artigo do Tagesspiegel que a Helena traduziu.

    Luta amorosa
    (Georg Kolbe)
    26.5.08
    Selfrighteous assholes e os seus apreciadores

    No início da campanha declarei – não a simpatia, nunca nutri especial simpatia por Hillary Clinton, - mas a minha preferência para ela como candidata a presidência americana. Ainda a mantenho, a preferência, embora ela me custe mais com cada aparição em campanha da senadora que tive o infortúnio de ver. A Senhora não só não parece simpática, mas também – a uma maneira muito americana – pouco genuína. Mas sei, e soube à partida, que a performance em campanha não tem muito a ver com o que é preciso para ser um(a) bom/boa presidente.
    A campanha é um jogo de representações, coreografado ao milímetro - o que explica a sensação de falsidade que tanto me incomoda. Mesmo assim há ainda, as vezes, a obrigação dos candidatos de improvisar, e então oportunidade para brilharetes não planeados e também para deslizes. O último deslize da Hillary, a referência do assassinato, parece permitir o golpe de misericórdia à candidata, que porém de misericórdia tem mesmo nada. Pelo contrário, é dos exemplos mais asquerosos e eloquentes da hipocrisia não só da campanha, mas da cultura política americana.
    Soube dele ontem pelo 5 Dias, e hoje o Daniel Oliveira passa, sem distanciamento, o correspondente comentário de Kenneth Olbermann. Se uma vez alguém mereceu o epiteto selfrighteous asshole, é esta personagem americana. O seu comentário alia o gosto de simplificar e a grandiloquência a um moralismo farisáico que se prende nas manifestações e insiste na recusa de qualquer olhar para além da superfície.
    Grave não é que existem tipos como Olbermann, grave é que há muitos que não se enojam e que apreciam a sua forma de comentar. Não só nos EUA. Ao que se vê, também aqui na Europa há (quem eu julgava com mais discernimento e decência) que não resiste de se servir dele, só porque lhe eventualmente convêm.

    P.S.: Alguém realmente acredita que Hillary Clinton deixou escapar a referência ao assassinato de Bobby Kennedy porque espera que algo semelhante aconteça a Obama? - Poupam-me!
    25.5.08
    nein. es ist nichts.

    Através da Rita descobri um blogue alemão (não leio blogues alemães), que exprime exactamente o que ainda tenho para dizer. Chama-se «não. não é nada.» e tem como mote «como ficamos uncool aos poucos. um blogue aberto sobre o nojo do próprio declínio.»

    Uns exemplos:

    «O novo amante:
    Esperar toda a noite que me lembre do seu nome. (No pequeno almoço desistir e inventar uma terna alcunha.)»

    «The Cure?
    Como antigamente ir ao concerto com bilhetes de borla cravados, mas ficar sentado atrás na galeria e depois de duas horas olhar para o relógio porque já não se está bem sentado.»

    «Ir ao médico
    ...e isso como homem.
    Entre as análises e os resultados morrer mil mortes psico-somáticas.»

    «Olhar para isto e pensar em que se podia escrever.
    Não, não me ocorre nada.»
    24.5.08

    de Songs of Innocence (Christopher Winter)

    com dedicatória à Biblioteca Municipal de Faro
    23.5.08
    A Feira do Livro

    Não são as barracas que me incomodam. Já os conheço e aprendi que aí se vendem livros e não farturas. O local no centro de Lisboa também gosto, e que ele é ao ar livre, tem até a sua graça, enquanto não chove.
    Mas uma coisa não tem desculpa: que ainda não se pôs o Parque Eduardo VII na horizontal!
    22.5.08
    Queluz, Rua dos Lusíadas

    [Fim de dia no supermercado. A juventude funcionária limpa as bancas refrigeradas.]

    Rapagão-Assistente do Talho - Ai, que se minha mãezinha me visse de pano na mão vinha-me já buscar!

    Rapagão-Chefe do Talho - Não estudaste, pois não? Atão aguenta-te, que...

    Menina da Charcutaria - ...eu estudei e estou aqui à mesma!

    (Ana Cláudia Vicente)
    21.5.08

    Venus frígida
    (Rubens)
    20.5.08
    Berliner Philarmonie

    Ânimo (2)

    «Na viagem de regresso, ao dar-me conta que não havia mais ninguém no cais, fui perguntar a um funcionário da estação o que se passava. Ele explicou que me venderam na Alemanha um bilhete para um comboio que não existia, porque no fim-de-semana essa linha estava fechada para obras. "E agora?", perguntei eu. "E agora, disse ele, vamos tentar mandá-la de táxi para a outra cidade", e telefonou imediatamente para combinar tudo. "E quanto é que isso me vai custar?", perguntei eu aflita, pensando nos mais de 100 km. "Nada", respondeu ele.» (Helena, em instantâneos holandeses)

    Não é de subestimar o valor de experiências dessas para a nossa forma de estar no mundo. Sem querer generalizar a historieta ao fim de um juízo sobre Holanda e os holandeses, ela é um dado que conta, como qualquer experiência concreta que fazemos. Também sem querer exagerar na generalização, veio-me a cabeça outro raciocínio, um pouco irracional, admito, mas dentro de limites acredito nele: Coisas boas tendem a acontecer a boas pessoas.
    Ânimo

    Enquanto o QeP não tem dado razão para isso nos útlimos tempos, o banimento da biblioteca de Faro tem me valido referências simpáticas de Eduardo Pitta, de Luis Naves e do Rui Bebiano. Não é só falta de tempo, mas também de ânimo que motiva a intermitência do meu bloguismo destes dias, que o Rui referiu. Por isso, foi um estímulo de que precisava e que agradeço muito. Continuarei, e que melhores dias virão para o QeP.
    15.5.08

    Strip
    (Samantha Wolow)

    Tenho pouco tempo, nestes dias, e quase esqueci-me das Playmates. Quem me lembrou foi a Sara Monteiro. Ela contou-me que o QeP está bloqueado na Biblioteca Municipal de Faro, por ter conteúdos impróprios para uma biblioteca pública. Não fiquei para aí além surpreendido. Vai aqui mais uma razão para a decisão dos guardiões da moral pública algarvia.
    10.5.08

    Reticulárea
    (Gego)
    9.5.08

    Não sei se Thomas Glavinic tem razão que algo especificamente austríaco contribuiu para que os crimes de Sr. Fritzl, tal como antes os do raptor de Natascha Kampbusch, ficaram tantos anos sem serem descobertos. Mas que isto foi possível, perturba-me. Sou um defensor convicto da privacidade, de que ninguém se meta no que os outros fazem dentro das suas quatro paredes. Mas a noção do mundo quotidiano que tenho e que me leva a ter essas convicções não inclui calabouços nas caves do meu vizinho.

    *(via Prozacland)
    60 anos de Israel

    Como é que se assinala os 60 anos do Estado Israel? - Se fosse outra pessoa, tivesse o talento e a experiência, faria assim. Como não sou, fico-me com isto:

    Dou os parabéns, desejo felicidades. Depois de milénios de humilhação, discriminação e de perseguição, os judeus israelitas conseguiram um espaço próprio onde ninguém os pode humilhar, discriminar ou perseguir. Continuam, sim, sob a ameaça diária à sua existência, de fora, e às vidas dos seus cidadãos, também de dentro. Apesar disto foram capazes de desenvolver uma sociedade vital, culturalmente e economicamente rica, e com liberdades cívicas ainda hoje ímpares nesta região.

    Mas é desonesto assinalar este dia de justa festa dos judeus israelitas sem lembrar que ele é um dia de igualmente justo luto e revolta de outros. Dos palestinianos que nele vivem e dos que nele já não podem viver. Haverá quem não perdoa este mas, como Henryk M. Broder não perdoa a outros. Mas dizer isto não é tirar uma jota ao direito de existência do Estado Israel. A primeira razão de defender a existência de Israel não são as raízes históricas que remontam para os tempos bíblicos. É o simples facto de que hoje nele vivem os judeus israelitas. E que, no momento em que Israel acabasse, estes seriam novamente alvos de perseguição, de humilhação, seriam expulsos ou massacrados.

    Ninguém deve ser obrigado de deixar de viver onde nasceu, ou ser privado da sua propriedade, liberdade religiosa e de expressão, carreira profissional de acordo com as suas capacidades, intervenção política na comunidade de que é membro. Com uma palavra, de plena cidadania.

    Para defender a existência de Israel basta invocar este lugar comum. Mas este direito elementar aplica naturalmente a todos, aos palestinianos também. Repitamos: Ninguém deve ser obrigado de deixar de viver onde nasceu, ou ser privado da sua propriedade, liberdade religiosa e de expressão, carreira profissional de acordo com as suas capacidades, intervenção política na comunidade de que é membro. Com uma palavra, de plena cidadania.
    3.5.08
    Nota de momento

    Estou aqui no bar do Hotel Trópico na Praia, a fazer tempo, já sem quarto, até ser altura para ir ao aeroporto, onde o meu avião para Lisboa parte às 3.35h. (Aqui são neste momento 00.20h.)
    Termina mais uma "missão" na minha tarefa de ajudar que os municípios desta ilha realizem os seus Planos Directores. Hoje participei em duas sessões de júri, uma em Cidade Velha, outra no Tarrafal, e estou exausto. Mas também contente. No meio de todas as dificuldades, de coisas que ainda não funcionam bem, inspira-me o optimismo das pessoas, que é genuíno e tem fundamento: tanto ainda que pode e deve ser feito! Começou ontem aqui a campanha eleitoral das autárquicas. Com muito comício e barulho ambulante, em festa. Não é do meu género, mas até isso aqui vejo com simpatia.
    Tenho uma boa impressão dos autarcas aqui, pelo menos de alguns com quem tenho contacto mais directo. Gente séria e empenhada em fazer a diferença. Tive de corrigir um preconceito, desde que cheguei aqui pela primeira vez, há já quase um ano.
    1.5.08
    Citação em causa própria

    This page is powered by Blogger. Isn't yours?

    Creative Commons License