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  • 28.7.08
    "We must believe"

    No Hole Horror, a Joana medita sobre a experiência de Ingrid Betancourt, de que ela nos 300 membros dos FARC que chegou a conhecer, não encontrou mais do que 2 ou 3 que revelaram compaixão. Acredito que mais do que todo o sofrimento físico, as privações, humilhações e sevícias ocasionais ou mais frequentes, esta experiência é a mais devastadora.

    Doenças e catástrofes naturais podem infligir traumas graves, físicos e psíquicos. (Leia-se o livro do FNV que a Joana tão bem apresenta noutros posts.) Mas o sofrimento causado pelos homens é o mais terrível, porque acrescenta a todos os outros ainda um: a destruição da confiança na bondade humana.
    Embora também nós, poupados desta experiência na própria pessoa, mas informados e esclarecidos, sabemos o suficiente para não confiar na bondade humana, confiamos. E bem. Mesmo aqueles de nós que, impelidos pelo conhecimento e pela razão, dizem que não confiam, confiam. Confiamos porque é uma necessidade. Pois confiar na bondade dos homens é condição indispensável para a felicidade. E sendo assim, pode-se medir a ferida que deixa uma experiência como a de Ingrid Betancourt.
    Sei que para alguém que foi poupado dela, especular sobre se esta ferida tem cura possível, roça os limites da decência. Ela me perdoe que o faço.
    A haver, a cura só pode passar por um exercício - assumidamente ou não, mas de facto religioso: Convencer-se, contra a experiência, contra a evidência, contra o melhor saber, que a bondade existe.
    Assim digo eu. Crentes diriam: que Deus existe.
    25.7.08
    Anti-americanismo primário



    200.000 alemães deram ontem em Berlim mais uma prova do profundo ressentimento anti-americano da esquerda europeia.
    24.7.08
    Imagens com texto

    Desde os primeiros tempos do nosso bloguismo, o J.J.Amarante limitou-se a ser um dos mais ilustres comentadores, até que finalmente respondeu aos desafios meus e de outros para lançar o próprio blogue. Chamou-o, com understatement característico, Imagens com Texto.
    É isso, mas é muito mais, é um dos melhores blogues que há por aqui, e é de uma frescura e originalidade que revela, pelo contraste, o cansaço de muitos que pertencem ao establishment da bloga portuguesa, no que incluo, mesmo se não por mais que a sua antiguidade, também o meu.

    Obrigado por teres começado tarde, Amarante! Ainda não tens as visitas que mereces, mas o futuro é teu...
    Rato ou mosca

    No auge do espectáculo do caso Maddie, um colega reformado do Inspector Gonçalo Amaral tinha uma coluna num jornal onde o comentava, com o assumido objectivo de defender o bom nome da PJ contra os seus detractores.
    Lembro-me que exprimiu a sua convicção no sucesso da investigação, realçando a especial qualidade dos seus colegas, a persistência. Disse – cito de cor – "os investigadores portugueses são muito ratos, não desistem".

    Sem dúvida a persistência é uma qualidade estimável num investigador policial. Convinha contudo que não fosse aplicada em substituição da inteligência ou da abertura mental.
    Caso contrário assemelha-se à persistência da mosca, que insiste em atravessar o vidro da janela. Só que no caso da PJ, quem fica lesionado não é apenas a própria.
    22.7.08
    A nossa justiça

    Quando, há 15 anos, pela primeira vez cá fui a uma consulta do médico de família e lhe solicitei explicar as medidas e prescrições que me tinha dedicado, ele perguntou-me, meio ofendido, meio espantado, se porventura tivesse estudado medicina. Tendo em conta que eu não era propriamente um trolha, conclui que a postura do médico no meu caso não era fruto de preconceito de classe, mas corporativo. O homem estava convencido que não tinha de prestar contas a mais ninguém a não ser aos seus pares e superiores.
    Semelhante sensação causou-me em tempos ouvir um colega referir-se a um juiz que acabou de conhecer. Baixava a voz, por tanta reverência para com o ausente. Trabalho no ramo da construção civil, e também aqui há personagens com estatuto e provas dadas, mas nunca encontrei ninguém que achasse, por isso, que estes não tinham de prestar para além dos seus serviços, também as contas a quem as recebia. No meu ramo presume-se a falibilidade de qualquer envolvido, ao contrário do que parece, ser o caso na medicina e na justiça.
    Bom, na verdade, presumimos sim, até o trolha presume. Pois mesmo que mostre, de dia, a reverência que julga devida, não se inibe, quando entre os seus, de resmungar contra a arrogância, a incompetência ou até a corrupção dos “lá de cima”.

    Entretanto, graças aos casos Casa Pia e Maddie, e não só, o prestígio da justiça anda pelas ruas de amargura. O discurso de reverência passou a ser cada vez mais raro e cada vez mais debitado como um daqueles dogmas religiosos nos quais já não se acredita mas que se julga dever continuar a afirmar, a bem de não se sabe bem o que, ou melhor, se sabe: da convenção e da preservação da ordem natural das coisas. Por outro lado, também graças à comunicação social, que gosta tanto de auscultar a voz do povo indignado às portas dos tribunais, o discurso da desconfiança indiscriminada ganha cada vez mais crédito, passa a ser “verdade que toda a gente sabe” mas não pode alterar.

    Ambos os discursos, o pai nosso da dignidade da justiça e o bota abaixo contra o “sistema”, são faces do mesmo problema. Enquanto no caso da medicina ainda há esperança que o mercado se encarregue ensinar aos médicos a sua responsabilidade perante aqueles a quem prestam o seu serviço (e quem pode permitir-se o luxo de recorrer ao privado já pode constatar este efeito), na justiça obviamente nunca veremos resolvido o problema por esta via.

    À justiça falta ainda adaptar-se à sociedade que se desenvolveu depois do 25 de Abril, com o consequente e natural crescente número de pessoas que podem fazer uso da sua cidadania e requerer os seus serviços. Tem de adaptar-se em termos materiais e organizacionais, como em termos de mentalidade, cuja necessária alteração se reflectirá certamente também na alteração de estruturas e procedimentos. Para além de meios, de formação, faltam aqui transparência e responsabilização, para não mencionar a imprescindível independência.

    Para como não fazer as coisas, o caso Maddie, agora arquivado, impõe-se como um case study. Quem e com que justificação aplicou os meios descomunais neste caso, em detrimento de outros? Como funcionou ou não funcionou a coordenação deste caso, quais erros foram cometidos, e não por último, quais foram as influências exteriores e levaram a quais consequências? Todas essas perguntas merecem ser respondidas, sim, publicamente, mas no âmbito de uma investigação competente e séria.

    A justiça é uma matéria diferente das outras, mas é uma matéria que diz respeito a todos nós, que deve por isso ser escrutinada não só nas corporações, não só nos corredores do poder, não só nos tablóides, mas por nós, interessados mas descomprometidos: a sociedade civil.
    21.7.08

    YES!
    17.7.08
    A troca triste

    Vi ontem na TV as imagens da devolução dos corpos do dois soldados israelitas raptados e mortos em 2006, contra cinco terroristas palestinianos vivos e ainda, ao que consta, de 200 cadáveres palestinianos.
    Num lado, comoventes imagens de luto; noutro a recepção, em apoteose, dos "combatentes" palestinianos - um desses matou uma criança de 4 anos com a corronha - não só pelo chefe da Hezbollah como pelo governo libanês.

    Sei o que sinto - revolta e desconsolo - mas não sei o que pensar.
    No Israel dizem que se fez a troca cumprindo a regra sagrada de lutar pelo retorno de todos os seus soldados, mesmo que mortos, para o seu país. Isto é nobre. Mas ser nobre muitas vezes paga-se caro em política. Especialmente neste caso.
    Não é pelo desequilíbrio na contabilidade. É a agudização, em vez do contrário, que esta acção tem trazido ao conflito entre Israel e o Libanon da Hezbollah e o reforço do prestígio e poder desta organização terrorista.
    13.7.08
    Nowhere

    O João Morgado Fernandes encerrou o blogue e despediu-se. Não quer sequer mais ler blogues.
    Quando aqui me estreei com o Quase em Português, não falta muito que há cinco anos, o seu "Terras do Nunca" um dos blogues de referência e um de que mais gostei. Por isso enviei-lhe a ele - e a nove outros - um mail convidando-o a visitar o QeP e, em caso de que gostasse, noticiar a minha chegada. Foi o que fez, com toda a simpatia. E continuou a acompanhar, especialmente os primeiros passos do QeP com interesse benevolente.
    Assim, quando-me lembro da minha história de bloguista, o que é cada vez mais raro ultimamente, o JMF nela terá sempre um lugar de relevo.
    Obrigado e farewell!

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    Leio que o Filipe fará uma pausa de blogue. Ou todo o Mar Salgado? Em qualquer caso é uma má notícia, mas tenho esperança de voltar a ouvir deles. Do Filipe e do Pedro.
    Super30

    Eu gosto de Al Jazeera. Especialmente gosto das reportagens sobre a vida social nos países asiáticos e africanos. São em regra muito boas e não tem par nos média ocidentais. O tom é diferente. Nunca é paternalista ou condescendete como o é quase sempre, mesmo nas reportagens dos mais bem intencionados dos nossos jornalistas.
    Na Al Jazeera nota-se claramente a intenção redacional na escolha das reportagens: Em regra mostram exemplos positivos de iniciativas da sociedade civil que não são patrocinadas nem pelo governo do respectivo país, nem por ocidentais, nem por ONGs. Com o objectivo evidente de fomentar a iniciativa cívica, a auto-estima e o ânimo do seu público nestas regiões. O que é jornalismo de causas, e um exemplo como jornalismo de causas é uma variante inteiramente digna e meritória.

    Há pouco vi um programa sobre o projecto Super30, de um matemático indiano que, porque experienciou como a sua própria carreira académica ficou vedada por falta de recursos, se dedicou a criar condições melhores para pobres jovens dotados. A sua escola prepara os seus alunos, inteiramente gratuita e incluindo acomodação e alimentação, para a admissão para os mundialmente prestigiados "Indian Institutes of Tecnology" (IIT). Condição de acesso é passar um teste de aptidão e ser pobre.
    4.7.08

    Serial-No 3817131 (#16)
    (Rachel Papo)

    A foto em cima é de um interessante documentário fotográfico de Rachel Papo sobre o serviço militar obrigatório das mulheres de Israel. Comove-me o sacrifício e a dedicação com que é assumido o dever de defender o seu Estado e as pessoas que nele vivem.

    Dito isto, manifesto o meu repúdio e escândalo perante a prática de Sippenhaft pelo Estado Israel, que retira aos familiares de terroristas palestianos, a cidadania do Estado que se encontra na terra onde viveram desde sempre. Igualmente vergonhosa é a demolição das casas destas famílias. Não só é totalmente indigno de um Estado de direito, como é claro indício de que as autoridades israelitas têm uma concepção do seu Estado que se baseia em critérios étnicos. O seja racista.

    Que venham com desculpas e justificações de segurança, mesmo com estatísticas que eventualmente provem a probabilidade maior de actos terroristas perpetrados por familiares de terroristas. Não valem. Simplesmente não valem.
    3.7.08
    Ingrid Betancourt

    Para nós, o público geral, a libertação de Ingrid Betancourt e dos outro catorze reféns é justo motivo de alegria e esperança, mesmo que a vitória, tendo em vista as centenas de reféns que continuam em cativeiro, por enquanto é mais simbólica do que real. (Bem real é, claro, para Ingrid e companheiros.) Não esqueçamos então estes os outros, e esperemos que a atenção mundial não as abandone depois da libertação da personagem mais mediática.

    Não consigo, neste momento, deixar de pensar também nos comunistas portugueses amigos das FARC, para os quais este dia será um dia triste, de mais um revés na sua nobre luta contra o imperialismo. Têm os meus sentimentos, mas que não são bonitos e têm um nome alemão não traduzível: Schadenfreude.

    Adenda:

    A ler isto e isto.

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