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  • 27.3.06
    Linguagem draconiana e anti-semitismo

    Um post do Dragão, que foi publicado já há alguns dias, deu origem a um debate, por vezes azedo, sobre a sua propriedade e o seu conteúdo eventualmente anti-semita.

    O post é simples. Faz referência a um estudo americano que descreve o (suposto?) poder do lóbi judeu na política externa americana. Para além da citação, o Dragão prediz as reacções indignadas – censórias - ao seu post, e para que a sua previsão se cumpre, escolhe um titulo provocatório: “O Sacrossanto Lobby dos pencudos”. Teve sucesso. Entre outros, a Helena deixou-se provocar, e surgiu o debate em que ainda participava, com destaque, a Zazie.

    Não li o tal estudo, por falta de tempo e de pachorra: se ele está mal ou bem feito não sei, para mim está adquirido que os judeus têm um lóbi poderoso nos EUA e não só, não está adquirido que isto é algo em si censurável.

    Agora, se o livre discurso sobre questões relacionados com Israel ou os judeus está condicionado pela omnipresente ameaça de se ser moralmente e sumariamente disqualificado como racista e anti-semita, já me interessa muito, não só em nome da liberdade de expressão como em nome da justiça e da razão.
    E está, não há dúvida. Ainda há dias apontei-o num artigo duma pessoa tão respeitável e lúcida como Ralf Dahrendorf . E o Dragão não está só ao sentir a mordaça, ao sentir de que não se pode dizer com a-vontade o que se pensa sobre esta questão.

    Para mim e para os alemães em geral a auto-censura neste domínio tornou-se virtualmente uma segunda natureza. Uma segunda natureza ainda incómoda para quem não interiorizou o tabu de tal maneira de que este deixa de acusar a sua existência. Para este ele significa um permanente peso na consciência, a noção duma deficiência moral. Como se o anti-semitismo fosse uma doença, um vício que ainda não conseguímos erradicar completamente, que, aliás, porventura será impossivel de erradicar em nós e por isso nos obriga ao combaté-lo eternamente...
    Um preço que estariamos, os alemães, talvez justamente a pagar, enquanto povo, se acreditasse que povos deviam pagar preços, e pagável comparado com outros preços que outros povos tiveram de pagar. Mas claro que não acredito nisto, não acredito em limitações do pensamento, que infelizmente e invariavelmente decorrem de tabus.

    Por isso, embora que não aprecio especialmente o estilo do Dragão, que frequentemente substitui uma argumentação leal pela sua retórica draconiana, simpatizo aqui com a sua provocação e suprimo o bem adquirido reflexo pavloviano de sacar o cacete do anti-semitismo.

    A denominação dos judeus como "pencudos" ou dos membros de etnias africanas como "pretos" tem, à partida, nada de racista, e deduzir do facto de que essas expressões são usados no discurso racista a sua proscrição é um exercício do politicamente correcto, que mostra a sua qualidade lamentável, que é a preguiça intelectual. Não há nada mais nocivo para a inteligência do que o cerceamento da linguagem.

    Eu sei que a crítica da Helena ao post não se centra só no “pencudo”, mas sim no estudo referido e a sua alegada tese que, como disse, não li, mas acredito na Helena e no Dragão que seja essa, de que a política externa dos EUA está refém dum lóbi judeu poderoso e por ele é levado a agir contra os próprios interesses e os de grande parte do mundo.
    Se isto é o caso ou não, acho eu, devia poder discutir-se sem que se chame logo anti-semita a quem o defende. Devia, mas é de facto impossivel.

    Detesto teorias de conspiração, e algumas das teorias mais detestáveis foram usados contra os judeus – aliás, seguramente são eles que levem a taça no campeonato mundial dos objectos de teorias de conspiração – mas não decorre da detestabilidade delas que não existem conspirações.
    Curioso salto de raciocínio: Porque estou a falar em conspirações? Só falavamos em lóbi. Aí está o problema: Basta alguém referir um lóbi judeu cuja influência ultrapassa as fronteiras dum país, vêm nos irremediavelmente à cabeça, entre outro, “os Protocolos dos Sábios de Zion”, e a “Conspriação do Judaismo Mundial”, tão badalada pelos Nazis, e colocamos o pobre diabo na desagradável companhia dos defensores destas teorias, e identificamo-no com os seus objectivos.

    Na prática isto significa que na discussão do lobiismo político dos judeus só ha dois campos: Os que defendem que este não existe ou que não existe nele nada de criticável, e os anti-semitas.
    Isto não é aceitável.

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