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  • 29.11.07
    Voar baixinho

    Mal retornado, o Miguel Silva escreve um dos posts mais importantes sobre a novela do novo aeroporto.

    «Na impossibilidade de comentar as opções, resta a faculdade de comentar o processo. Não ficaria surpreendido se uma boa parte das pessoas que acompanham vagamente os avanços e retrocessos deste projecto manifestasse uma opinião negativa em relação ao processo de decisão em curso. Mais, não me surpreenderia que essas mesmas pessoas considerassem que por cada novo estudo que surge, mais do que uma avaliação técnica, surja um interesse oculto qualquer em arrastar a obra para determinado local.
    Este tipo de opinião negativa em relação aos processos de avaliação e decisão é do pior que pode acontecer a um sistema político que se quer democrático.»


    Recomendo lê-lo na íntegra.

    Como o Miguel bem diz, um cidadão comum como ele ou eu não tem conhecimento suficiente para ter uma opinião informada sobre a matéria, nem é exigível que tenha.
    Muito mais do que a eventual decisão menos correcta na localização do aeroporto, aflige-me o processo da sua discussão e decisão. A mim, e calculo, a muitos outros. Faz parte dos efeitos nefastos deste processo que se instala, para além da convicção de a decisão final não será resultado da melhor opção técnica, mas da vitória do interesse particular mais forte, a ideia fatalista que o que mais falta é a decisão, qualquer decisão. Ou seja que ela alimenta o nosso apreço, como o Miguel diz, por uma "liderança musculada".
    Esta reacção é compreensível, mas não por isso menos errada. A inclinação para substituir a transparência e responsabilização que falta pela autoridadade é característico de uma sociedade menos evoluída.
    Não nos falta o homem forte que corta o nó górdio, falta uma cultura e procedimentos institucionais que permitem desemaranhar este nó e de identificar nele o que é merece consideração e o que não.

    Para isso seria preciso transparência, ou seja, por um lado, a disponibilidade pública dos elementos que enformam a decisão, e, por outro, quem de forma desinteressada possa fazer a sua apreciação. A disponibilização cabe aos decisores, ou seja, o governo, a apreciação à sociedade civil e à comunicação social, que para este efeito recorriam a peritos que têm uma reputação de idoneidade a defender.

    E seria preciso responsabilização, ou seja, que os decisores políticos tivessem razão para temer que uma decisão em função de outros interesses além do nacional seria severamente castigada - no mínimo em termos eleitorais, senão criminais -, e que a comunicação social e os peritos tivessem razão para temer que uma postura menos idónea prejudicaria seria detectada e abalaria gravemente a sua credibilidade, e por consequência, o seu futuro no mercado.

    A falta de transparência e responsabilização em Portugal é, mais do que um problema institucional, um problema cultural. Ainda hoje incomóda-me o provérbio português, que diz "o segredo é a alma dos negócios". Claro os negócios têm de ter o seu lado necessariamente secreto. (O caso já não é tão linear quando envolvem o Estado). Mas o problema de fundo é que toda a actividade económica em Portugal, e nomeadamente a que envolve o Estado, desenvolve-se num clima onde predomina o nevoeiro, a dissimulação, a ambiguidade e a duplicidade de critérios e procedimentos, que os seus actores julgam vantajoso para eles, e que até o são, em muitos casos.
    Só que no cômputo geral, todos saiem a perder, pois é esse clima terceiro-mundista que distorce a concorrência, sabota as escolhas em função da qualidade, impede que se premeia o mérito, e no fim, impede o progresso.

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