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  • 16.11.07
    Casamento vs. domínio sobre o próprio corpo

    Isto foi um comentário a este post do Tiago, só quando o quis lançar, ja não pude. Vai então aqui.


    O Tiago concorda com a obrigação, aparentemente constante no código deontológico dos médicos, de recolher o consentimento do cônjuge, antes de realizar uma vasectomia. Eu não. Entre outro, acho esta regra muito pouco liberal.

    Por falta de conhecimento meu, vou deixar de parte a questão a que realmente vincula, em pormenor, o contrato que é um casamento civil. Embora o duvido, vou aqui assumir como hipótese que ele realmente obriga os cônjuges a disponibilizar-se para a procriação.
    Entendo que não se pode subordinar um direito fundamental como o do dominio sobre o próprio corpo de forma irreversível a um mero contrato. Claro que contratos limitam direitos, também os fundamentais. Mas não devem ser irreversíveis. Assim, quando alguém abdica por via de contrato de um direito fundamental, deve sempre poder voltar atrás e reavê-lo.

    Em concreto: Se eu, casado, optar por uma vasectomia, ou pelo uso sistemático da contracepção, ou pela continuada abstenção sexual, estou eventualmente a violar o contrato do casamento. O lesado (lesada, no meu caso) pode então exigir o seu cumprimento. Mas se não consegue obtê-lo, a solução deve passar pela resolução do contrato e uma indemnização adequada. Não admito que o estado ou, por delegação, uma entidade corporativa ou privada, tenha o poder de impor o cumprimento do contrato. Só podia admitir essa imposição em casos extremos, em que a violação do contrato criaria um dano grave e irreversível ao lesado. Como por exemplo um contrato de assistência médica em que a parte prometente não quer realizar uma operação vital a qual se comprometeu.
    O casamento não é desses. Pois o parceiro lesado pode sempre realizar o seu objectivo de procriação noutro casamento.

    Assim, o que acho apropriado no casamento, é que o parceiro que quer proceder a uma esterilização, irreversível ou reversível, seja obrigado de informar o cônjuge. E admito que o estado, no caso por delegação ao médico, assegure que essa informação é mesmo dada antes da intervenção.
    Informação, sim. Consentimento, não.

    Para não falar só do casamento, dou outro exemplo: Supomos que celebro um contrato com o Tiago em que me comprometo, contra um honorário pago antecipadamente, de limpar a sua retrete durante o próximo ano. Depois de uma semana, descubro que foi má ideia e que quero desistir. Acho que o Tiago teria, neste caso, direito à devolução do honorário, acrescentado por uma indemnização. Não acho que no restante ano deveria ser obrigado, com escolta policial, de comparecer na casa do Tiago e lhe limpar a retrete.

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