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  • 17.6.07
    O estado das coisas

    Teria votado em Sócrates, nas últimas legislativas. E assisti, em 2005 e em 2006, com esperança ao estado de graça do novo governo, à sua visível determinação em concretizar pelo menos parte das suas promessas. Não é que concordava com tudo que pretendiam fazer. Mas como crente na democracia representativa, onde se elege um programa em pacote, e não se pode escolher as políticas à la carte, preparei-me de engolir também os sapos que viessem ao prato.

    A minha esperança de que o governo leve a cabo algumas das reformas urgentes e imprescindíveis, com quais se comprometeu, já esmoreceu, embora ainda não morreu.
    Mas começa a ser-me insuportável a sua arrogância, o desrespeito pelos seus críticos e a descarada ostentação da sua impunidade. Impunidade que infelizmente existe, e que tem as suas origens: Na maioria absoluta, num Presidente da República que concorda tanto com o estilo como com a política do Primeiro Ministro, e na impotência da oposição, hoje tão total como em 2005.
    Tem mais uma causa, que infelizmente não é conjuntural como as anteriormente referidas: A ausência de uma sociedade civil independente e comprometida com os valores básicos do regime. Notem, não disse “comprometido com o regime” – destes não há falta: dos empresários aos sindicatos, das corporações aos intelectuais, abundam os comprometidos com o regime, só é que o são pelas razões erradas, pelo aproveitamento dos seus defeitos – disse: com os valores básicos do regime.

    Muitos não sabem o que são os valores básicos do regime, outros se estarão nas tintas para com eles, enquanto não sentem a sua falta directamente na própria pele. Outros ainda se queixam, mas então do próprio regime, que confundem com o seu status quo viciado.

    Infelizmente, a sociedade civil, em Portugal, não mete medo a governante nenhum. Ao contrário dos lobbies, que são - é preciso dizê-lo? - uma coisa muito diferente. Mas uma sociedade civil que defende, antes dos seus interesses particulares, o regime, ou seja, o bom funcionamento das instituições, a transparência, a responsabilização dos seus agentes e as liberdades cívicas, essa não existe.

    Por isso há instituições do ensino superior de credibilidade duvidosa e quem nelas consegue obter canudos de forma pouco ortodoxa; por isso pessoas como a directora da DREN continuam em funções, mesmo depois de entrevistas em que reafirmam toda a sua falta de cultura democrática; por isso continuam a ser movidos processos, de uma forma aparentemente arbitrária, contra pessoas que publicam informações incómodas para o governo, enquanto outros processos não avançam, por falta de meios.
    E também por isso consegue-se preparar a construção dum novo aeroporto bilionário durante anos, sem que existe um debate transparente e fundamentado sobre as suas vantagens e desvantagens, as suas características e sua localização.

    Mas certamente não é pela destruição do regime, que Portugal ganhe uma cultura de transparência, justiça, rigor e competitividade.

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