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  • 23.3.07
    A juiza relativista

    Em Frankfurt, Alemanha, 2007: Uma mulher de origem maroquina, vitima de violência do marido, solicitou o divórcio de urgência, com dispensa do cumprimento do ano de separação obrigatório na lei alemã, excepto em casos em que isso constitui uma violência inaceitável. A juíza recusou o pedido: “O exercício do direito de castigar não preenche o critério de violência definido pelo parágrafo 1565”.

    Embora lamentável e inaceitável, é de dar de barato que num sistema judicial dum país de 80 milhões de habitantes haverá sempre juízes idiotas, juízes que acabaram por passar-se e ainda não foram retirados do serviço, e por consequência as vezes decisões estapafúrdias. Para corrigir estas - também para corrigir estas, existe a instituição do recurso à instância superior.
    Uma pergunta que se coloca todavia é se esta decisão representa mais do que a si mesma, um disparate avulso. É evidente que o escândalo parte do pressuposto que sim. De que ela é indício dum novo paradigma, o do relativismo cultural, ou até da já consumada subversão islamista dos tribunais da República Federal de Alemanha.

    Eu - ainda - não sei. Não sei se a juíza é muçulmana e/ou simpatiza com o código da Sharia, e por isso aprova a violência do homem contra a mulher dentro do matrimónio. Ou se, não sendo muçulmana, tem uma visão tão absoluta do casamento, que nem espancamentos repetidos e ameaças de morte pelo marido lhe configuram razão suficiente para facilitar o divórcio. (Essa visão não é só própria dalguns muçulmanos!) Ou se acha, o que a parte citada da sua justificação permite supor como o mais provável, que com o casamento islâmico a mulher abdicou do seu direito a integridade física, e da protecção que a constituição do estado alemão garante.
    Em todos o casos está obviamente em flagrante contradição com a lei vigente e com os valores da sociedade que tem obrigação de servir, e consequentemente desqualificada como juíza.

    Ainda assim gostava de ver respondida a pergunta, se uma idêntica decisão dum juiz, se o casal visado não fosse muçulmano, mas alemão e cristão, teria levantado o mesmo vendaval de indignação. Haveria indignação, tão justa como esta agora, mas calculo que muito menos. O caso tem tanta explosividade porque é um excelente exemplo para quem se preocupa com o impacto que a imigração dos países islâmicos tem na nossa cultura ocidental.

    O caso mostra uma resposta errada a um problema sério:
    O problema é que, com o crescente peso demográfico dos imigrantes islâmicos, o consenso moral e cultural está posto em causa. Há quem alega que os islâmicos já começaram a “infiltrar” as instituições do estado. Essa infiltração, note-se, nem precisa de ser resultado dum plano subversivo, engendrado nas madrassas alemãs, e não é fácil de impedir nem o seu impedimento fácil de legitimar. Pois é o natural resultado da sua integração na sociedade, e essa passa, se merecer esse nome, também pela ocupação de lugares em todos os sectores, privados e públicos, culturais, económicos, políticos e também da justiça. E é também natural que as pessoas trarão com elas referências culturais e morais que porventura são divergentes do nosso cânone laico, liberal e democrático. O que é um problema. Esperamos que a integração passa pela assimilação dos valores, cuja consensualidade é o fundamento da nossa sociedade. Mas há indícios que não é caso.

    Em resposta a este problema, a juíza parece ter agido de acordo com uma linha de pensamento não tão marginal na Alemanha, que se pode chamar relativismo cultural. (Que uma juíza professe uma tal crênca, é obviamente de ironia suprema!) Esta ideia tem a sua origem na luta da esquerda contra o imperialismo, aqui o imperialismo cultural. Na perseguição demasiado diligente desta nobre tarefa, alguns, não poucos infelizmente, chegaram à conclusão peregrina da equivalência de todos os sistemas de valores. Uma postura atractiva para quem não quer esforçar-se em demasia pelo rigor quer intelectual quer moral. Sempre se evita ser acusado de xenófobo.
    Mas se na política externa talvez seja necessária alguma moderação no empenho na exportação dos nossos valores para sociedades cujas referências estão longe das nossas, permitir dentro da nossa própria sociedade que cada tribo vive segundo os seus códigos autónomos, desvinculada dos valores basilares comuns, acaba por levar, em última instância, ao sacrifício da própria civilização. Uma sociedade que não se esforça continuamente na procura de consenso em torno de valores basilares comuns, - que podem evoluir, sim, mas sempre terão que ser valores comuns... uma sociedade que se demite disto está condenada.

    (alterado)

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