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  • 2.2.07
    A rãzinha

    Já falei aqui dos meus pais, e quem leu as minhas notas autobiográficas (links aqui ao lado), sabe que os tenho em grande apreço, e porquê. Espero por isso não ser muito indecoroso ao relatar uma memória de infância, em que o meu pai mostra um comportamento talvez um pouco censurável. Estou seguro que ele, que sei por vezes se dá ao trabalho de decifrar os meus textos quase em português, me perdoará a indiscrição.

    Tinha quatro anos e aconteceu nas minhas primeiras férias de família. Férias fantásticas na lindíssima ilha frísia de Ameland, que nunca mais visitei e nunca mais visitarei para não destruir as minhas recordações. Estas férias deixaram-me marcas indeléveis, entre outras, uma paixão pela navegação. Até aos doze anos queria ser capitão de alto mar, claro que num veleiro tipo Sagres. Isso passou-me, mas não a resposta infalível e instintiva ao cheiro límpido de pinhal, areia e mar, com um sentimento de profunda alegria de viver.

    O episódio é este. Ao sairmos, pai, mãe, a minha irmã de ano e meio e eu, do Dois-Cavalos, num parque de estacionamento ao pé das dunas, detectei no chão arenoso uma pequena rã morta, já seca, espalmada por um pneu implacável, mas de forma exacta assim que tudo ainda se identificava perfeitamente: cabeça, corpo, pernas e patas, até os dedinhos minúsculos.

    Eu: Olha pai, uma rãzinha morta!
    Pai: Onde? - Pois é.
    Eu: Coitada da rãzinha!
    Pai: Pois é! E coitada da mãe! Imagina a ela: Está agora a espera da sua filha que está morta e nunca mais vem!
    Começam a chegar-me as lágrimas.
    Pai: E coitado do seu pai também, que também gosta muito dela, e toda a família. Decerto esperam e esperam e já procuram em todo o sítio e perguntam a toda a gente, mas não adianta nada, porque eles não sabem que a rãzinha está morta e nunca, nunca mais volta para casa!
    Eu desfaço me em soluços.
    Mãe: Ó Ernst, chega! Pára com este disparate! Vem cá Lützchen, não penses mais nisso!

    ...

    As coisas de que me lembro estes dias!

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