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  • 4.11.05
    Dois pesos e duas medidas?

    O Carlos Manuel Castro indigna-se com aqueles, "que tanto se exaltaram na rua com, primeiro, a possível pretensão norte-americana e, depois, por causa da intervenção militar no Iraque, não promoveram nenhuma manifestação a repudiar as palavras do Presidente iraniano".

    Não me vou aqui colocar na defesa de todos estes manifestantes e nomeadamente organizadores destas manifestações – que neste caso se ausentam - e garantir pelos seus motivos idóneos.
    Mas repito que o argumento, que não é novo, não me convence.

    Sempre me incomodaram manifestações que visam exclusivamente dirigentes e governos estrangeiros. Não é que esses não dessem razões para criticas e repúdios, mas manifestações deste tipo pelo menos arriscam parecer chauvinistas e dirigir-se não contra o regime, mas o povo, o país.
    E depois: Que sentido faz ir à rua em Portugal e manifestar-me contra o Sr. Ahmadinejad, ou, já agora, contra o Sr. Sharon ou o Sr. Bush?
    As minhas manifestações fazem - se fazem - efeito onde se realizam, no meu país com uma sociedade civil e governantes que dependem da opinião pública, não num país estrangeiro, que em regra não depende da opinião pública do meu país, se depende de alguma. Por isso acho que o destinatário duma manifestação são e devem ser os próprios governantes, a própria sociedade em que vivo.
    Assim, uma manifestação contra a invasão do Iraque (se sou contra ela...) justifica-se, se o meu governo participa nela ou a apoia, e uma manifestação em Portugal na ocasião das declarações do Presidente Iraniano faria, no meu entender, todo o sentido, se achasse que o meu governo não o condena o suficiente, não faz as pressões devidas ou ainda mantém negócios criticáveis, como por exemplo trafego de armas ou de tecnologia nuclear, com ele.
    (Nesta lógica admito ainda que, se me manifesto contra políticas dum país estrangeiro com o qual me ligam fortes laços de solidariedade, amizade, partilha de valores e ainda a parceria em organizações comuns de segurança como a OTAN - como é o caso dos EUA e do Reino Unido - ainda estou a pressionar os meus.)

    Não é que acho ilegítimo manifestações contra regimes estrangeiros e os seus actos, e nem sempre desapropriados. (Ocorre-me, só a título de exemplo, o apartheid na Africa do Sul, a ocupação chinesa de Tibete, a guerra suja russa na Tchetchenia. No primeiro caso pode atribuir-se algum sucesso às nossas campanhas, onde seria interessante investigar em que medida o facto de que os sulafricanos brancos foram, de certo modo, "os nossos", pesou; no segundo caso não houve nem se prevê sucesso nenhum; no terceiro nem campanha houve ou há.)
    Também não significa, se não acho apropriado manifestar-me na rua, que não defenda que se faça campanha pela melhora da situação nos estados visados. O que convém é salvaguardar que as campanhas não acabam de funcionar contra o país, o povo, nem que elas podem ser aproveitadas propagandisticamente neste sentido pelo regime em questão. A melhor forma aqui é o apoio à oposição democrática interna, a insistência no respeito pelos direitos humanos. Partilho aqui, no que diz respeito ao Irão, a esperança de Timothy Garton Ash.

    O que refuto - até digo: como calunioso - é o argumento que a prevalência quantitativa de manifestações contra actos e políticas do meu lado seja indício de que simpatizo e me identifico menos com ele do que com o outro. O contrário é o caso.

    Imagino que esta ideia é um left-over do tempo em que o combate político ainde era marcado pelo antagonismo entre os campos do "socialismo real" e do "imperialismo", e em que partes da esquerda europeia efectivamente se identificavam mais com regimes "socialistas", como os do partido Baath, do que com o regime capitalista em que vivia. Olhando para Portugal, com o seu Partido Comunista (e talvez uma parte do Bloco de Esquerda), não posso afirmar que essa visão desapareceu por completo, embora que ela nunca se podia aplicar ao actual caso do fundamentalista islâmico Ahmadinejad.
    Mas não falo só por mim, falo seguramente pela vasta maioria dos que se maniferstaram na rua contra a invasão do Iraque e não o fizeram contra as declarações do presidente iraniano, que não é essa visão absurda a explicação desta opção.

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