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18.5.05
(Uma resposta ao João Tunes) Quando entramos pela primeira vez numa sociedade em que não nos conhecem, estamos especialmente cautelosos e empenhados em não cometer gaffes, não dar má imagem, e acima de tudo, não ofender ninguém. Depois, com o tempo, essa preocupação passa, e, se as coisas correrem bem, acabamos por sentir-nos à vontade. Foi o que me aconteceu. Encorajado pela simpatia, por vezes até pelo incitamento por parte de co-bloguistas, que me acolheram neste espaço virtual luso, que, como o João, generosamente deram a sua atenção e até troco ao alemão que aqui se pôs a falar quase em português, fiquei cada vez menos consciente de não estar em casa. E acabei de ferir sensibilidades nacionais. Sempre o disse: Não tenho pretensões nem ambições de me transformar num português, coisa que sei impossível. Cheguei aqui aos trinta e três anos, com tempo de vida suficiente para ter adquirido uma identidade nacional que não se despe como um fato; e por outro lado Portugal não é America: não faz (ainda?) parte da identidade nacional portuguesa ser se imigrante ou descendente de imigrante. Tenho, sim, pretensões de ser cidadão de Portugal, coisa que dou por largamente adquirido. Sou cidadão que vive e trabalha aqui, paga impostos e segurança social, educa os seus filhos e assume, mais limitado pela própria preguiça do que por obstáculos que lhe são colocados por fora, o direito (e dever) do cidadão: intervir, não só votar (nas autárquicas), o que faço com especial alegria e orgulho, como tomar posição na vida quotidiana, por exemplo enquanto pai na escola do filho, ou também aqui, neste divertimento tão aliciante como inconsequente que é o bloguismo. Mas, caro João, não ponho em questão a diferença entre o concidadão que sou e o compatriota que não sou. Como cidadão, por exemplo, permito-me dizer: O sistema de saúde em Portugal é uma merda. Nunca poderia porém dizer, (mesmo se o pensasse, o que não é o caso) o que já ouvi muitas vezes portugueses dizer em jeito de desabafo: Este país é uma merda. Tenho consciência que beneficio, nas minhas intervenções opinativas, da ambiguidade da minha situação, podendo escolher as minhas referências, conforme-me convém, ora alemãs, ora portuguesas. A minha manifestada intriga sobre que num país livre um partido como o PCP possa ter 6%, 7%, ou até 10% de votos, que irritou o João, é um bom exemplo disto; ela provém da minha experiência específica alemã federal: Na RFA, a óbvia presença do simples facto, que o regime comunista atirava para matar sobre pessoas que não fizeram mais do que tentar sair do estado em que viviam, era o suficiente para que o partido comunista da RFA (o DKP) nunca nem um percento dos votos alcançava. Sei que as experiências portuguesas com o PC são outras, melhores. E foi isso que quis reconhecer, dedicando por isso ao facto que me intriga, um mero encolher de ombros, articulado pelo, para a minha surpresa, tão ofensivo enfim. Os dignos comunistas alentejanos, de que falou, conheço bem, por via familiar: a minha mulher é de Beja. É verdade que sofreram e lutaram em condições duras e difíceis contra a opressão. Mas não aceito, que ainda hoje se diga, que foi pela liberdade. Subjectivamente, sim. Não quero negar que muitos, menos bem informados, nestes tempos acreditavam lutar mesmo pela liberdade, acreditavam que seria mesmo isso o que o Partido pretendia instalar. Embora já na altura o exemplo da "democracia" interna do Partido poderia tê-los avisado. Também sei que não houve, em muitos casos e durante muito tempo, alternativas na oposição. Mas entretanto passaram mais do que trinta anos, em que nos chegou farta informação credível e de fontes muito variadas sobre o comunismo do modelo soviético. E depois de descontar os votantes comunistas de hoje, que não sabem ler, e que julgo ser seguramente uma minoria, concluo: Quem hoje ainda acha que o marxismo-leninismo é liberdade, não quer saber, ou não quer tirar as conclusões do seu saber. E perante este não querer saber, ou a incapacidade de tirar as conclusões, é que encolho os ombros. Perante isto mantenho o meu enfim. Que palavra alternativa propõe para quem vote num partido em cujo jornal oficial se escrevem editoriais como este? E mais, mesmo para quem não lê o jornal oficial, como eu, sequer dos partidos em que vota, está à vista a forma "democrática" como eles gerem os seus assuntos internos. É isso aliás que me leva a dar incomparavelmente mais crédito ao BE, também um partido constituido por outros cujas referências foram ou até ainda são regimes e ideologias que se revelaram a pura barbarie, do que ao PC: A prática democrática. Sobre a minha perplexidade selectiva: Ela foi selectiva, é verdade. E concordo, não me lembrando de algo a excluir, integralmente com a sua lista de assuntos que merecem igual perplexidade. Mas essa minha perplexidade surguiu neste caso – não é natural? – de forma espontánea. E logo selectiva. Não vejo mal nenhum na manifestação selectiva das minhas perplexidades, indignações ou dos meus entusiasmos de momento. O equilíbrio faz-se com o tempo. Ou não se faz. Neste caso falaremos. Por fim: Se ouviu alguma arrogância nacional no meu comentário, penso seriamente que ouviu mal! Para dissipar esta ideia, quero lhe referir o exemplo do meu país, onde se verifica, em vários estados federais, que 6%, 7%, ou até 10% das pessoas votam em partidos da extrema direita. Para comentar isto, não me basta nenhum enfim. |
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