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22.10.04
Há uns largos anos atrás ajudei a um amigo pintar a nova casa. Eramos estudantes, e nesta altura, antes da queda do muro, era economicamente suportável por um estudante comum alugar um T0, T1 ou até T2 num prédio velho num bairro operário berlinense. (Porque o éxodo, que Berlim ocidental sofreu após a construção do muro, deixara muitos fogos vagos, e a limitação legal das rendas tratara do resto.) Não sou supersticioso, mas juro que já antes de entrar na casa, senti-me mal. Talvez a razão era o bairro, o Wedding, um dos muitos bairros berlinenses com uma tristesse muito própria, ou o prédio, feio, mas não mais feio do que tantos outros; - mas antes de mais, não tenho duvida, foi o fogo, vazio, que, apesar de também ele à primeira vista em nada diferente de outros, nos sugava toda a energia e alegria: de tal maneira que aquilo que tinhamos imaginado como uma divertida acção colectiva de restauro, com conversa e umas cerveijecas pelo meio, se afigurava como um tarefa quase insuportável, um pesado dever cujo fim ansiavamos mas que estava longe de vista. Emfim, abrímos as latas, pegámos nos rolos e começámos. Quem tinha morado aqui antes, certamente já não tinha sido um velho berlinense: O papel de parede já estava coberta dumas camadas de tinta, que em tempos tinham sido, mas já não eram bem brancas. Numa parede do quarto, estava escrito em pinceladas grandes e vermelhas: SCHEISSE (merda). Mas não era este escrito que me assustava. O que me literalmente arrepiava, eram os textos que encontrava em todo o lado, enquanto avançava pintando, nos cantos mais improváveis e escondidos, na cozinha, no corredor, na casa de banho. Escritos à lápis ou à esferográfica, sempre numa letra minúscula: merdamerdamerdamerdamerdamerdamerdamerdamerda não posso mais nao posso mais não posso mais não posso mais nao posso mais não posso mais não posso mais nao posso mais não posso mais não não não não não |
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