Cujo tema era isso mesmo:
Concursos literários. Uma das histórias vencedoras é esta:
Rascunhos
Quando rasgo um papel fico sempre com
pena remorsos. Pior ainda quando leva lá rascunhada qualquer palavra escrita. Ainda que seja só uma palermice,
como esta, parece-me sempre injusto deitar a perder um pensamento. No entanto, nunca deitei a mão a um cesto para recolher uma folha amarrotada. Falta-me a coragem de enfrentar o que já é passado.
Sou mulher de olhar em frente. (apagar esta ideia, fez-me azia)
É estranho, porque não tenho medo do escuro, (
só às vezes), nem das alturas, ou de aranhas... tenho
muito medo de não me rever nas letras debitadas em momentos de devaneio. É que, quando escrevo sinto-me regressar ao início do século XX, qual surrealista em possessão artística. Corto as ligações à realidade aparente e
vagueio flutuo qual budista em nirvana. Sinto-me agitada, mas numa serenidade que parece perpétua. E, na maioria das vezes, parece-me que escrevo
com sem sentido. Mas sinto-me
quase sempre feliz.
Esta é uma noite diferente, porque aceitei o desafio. Escrevo, releio, corrijo a vírgula e o ponto final. É melhor apagar a ideia. Rasurar o que não interessa. Já está. Este não vai para o cesto cinzento ao lado da pilha das revistas velhas. Fica aqui. Há um concurso literário a decorrer. Nunca se sabe se eles gostam de textos rasurados...
Susana Paixão