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10.3.04
O post de Nuno Guerreiro é extenso e multifacetado. E como já disse, vale a pena lê-lo na íntegra e com a necessária atenção. Mas vou aqui, no Quase em Português, citá-lo em partes, temáticamente distintas, assim como me esclareceu aspectos diversos da questão. A primeira (re-)descoberta é a da precaridade psicológica em que inevitávelmente uma pessoa se encontra, que é membro dum povo cujo direito a existência foi desde tempos ancestrais, e da forma mais concreta e brutal, posto em causa. (Eu como Alemão devia ter consciencia disso, mas também eu esqueço-me frequentemente deste fardo): "Apesar de todas as formas de racismo e xenofobia serem execráveis na essência, infelizmente o antisemitismo não pode ser catalogado como uma simples variante destas aberrações sociológicas. Num livro em que analisou com acutilante lucidez o antisemitismo entrincheirado na sociedade francesa, (Réflexions sur la Question Juive) Jean-Paul Sartre escreveu: “O que pesava sobre ele [Judeu] originalmente era a acusação de ser o assassino de Cristo. Alguma vez parámos para ponderar a intolerável situação de homens condenados a viver numa sociedade que adora o Deus que eles são acusados de matar? Originalmente, o Judeu era então um assassino ou o filho de um assassino – o que aos olhos de uma sociedade com um conceito pré-lógico de responsabilidade acaba inevitavelmente por ser a mesma coisa – e por isso ele próprio tornou-se um taboo. É evidente que não podemos encontrar aqui a explicação para o antisemitismo moderno; mas se o antisemita escolheu o Judeu enquanto objecto do seu ódio, é por causa do terror religioso que este sempre inspirou.” [...] O judeu enquanto pária social tem sido objecto de inúmeros tratados, ensaios e romances. A sua caracterização cabe aqui como parte da discussão destas raízes. No livro que acima referi, Jean-Paul Sartre refere-se também a essa condição: “Este é talvez um dos significados de O Julgamento de Kafka, ele próprio um judeu. Tal como o herói deste romance, o Judeu está envolvido num longo julgamento. Ele não conhece os seus juizes, raramente os seus próprios advogados; ele não sabe do que é acusado, mas mesmo assim sabe que é considerado culpado; a sentença final é continuamente adiada – por uma, duas semanas – e ele aproveita estes atrasos para melhorar sua posição em milhares de formas possíveis, mas cada precaução tomada ao acaso empurra ainda mais o espectro da culpa. A sua situação externa pode parecer brilhante, mas o julgamento interminável fá-lo definhar, e por vezes acontece, tal com no romance, que homens o carreguem sob a pretensão de que perdeu o caso, e o assassinam num qualquer baldio dos subúrbios.” [...]" Claro que isso não justifica posições ou actos que para alguém livre deste fardo seriam injustificáveis. Mas ajuda a compreendé-las. Mais: Mostra como extremamente exigente é esperar - por exemplo no conflito Israel-Palestina - um comportamento generoso, com gestos de confiânça, que se dê o primeiro passo.... (Pretendo ainda abordar, mas não hoje, outros aspectos deste post...) |
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