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  • 28.1.04
    Comunicação e Espaço

    Este post é uma tradução dumas notas minhas que já tinha alguns anos, e dos quais me lembrei graças ao post serendipity do Lourenço nO Projecto. A questão nele levantada acho uma das mais importantes e fascinantes para quem se interroga o que hoje e amanhã pode ser arquitectura.

    Pelo menos até há muito pouco tempo não havia dúvida de que a profissão do arquitecto era a concepção do ambiente espacial do homem.
    A tradicional ideia do arquitecto que os leigos têm, mas também a maioria dos arquitectos têm deles próprios, é a de um especialista que concebe edificícios, isto é, projecta um ambiente físicamente real (e coordena a sua realização). Ele assume a responsabilidade pelas características desse ambiente físico, das suas qualidades construtivas, funcionais e estéticas. Enquanto os dois primeiros aspectos não são exclusivos do seu metier, são também do dos engenheiros, é o genuinamente característico da sua profissão o terceiro.

    Esta terceira área perde - enquanto se limita à realidade física – diáriamente importância no espaço de experiência ("Erfahrungsraum") do homem. Este espaço é cada vez mais preenchido por conteúdos que não existem no seu espaço físico. Informação chega lhe e comunicação - em tempo real - faz se atravessando distâncias já não sensualmente compreensiveis, e cria lhe uma "vizinhança" que não tem nada a ver com o espaço físico em que ele se move.

    O espaço físico como palco da comunicação, da interacção social: Grande parte do fascínio e encanto de lugares “genuinos” (normalmente antigos) provém provavelmente da relação estreita – da dialéctica da mútua representação - entre a interacção social e realidade física. Os objectos não só mostram os vestígios do uso, como são também requisitos da interacção social, dos rituais, são simbolos de status etc. No tempo da telecomunmicação uma parte substancial desta comunicação é privado deste plano, da representação no espaço e do ritual. (A classica cena de filme cómico das vénias do subordinado que fala com o superior ao telefone.)
    Mesmo assim, até há pouco, ficou o lugar: Isto é - por exemplo - o escritório, com a mediação pela telefonista e secretária na antecamara. O telefone como objecto já não podia encarnar o que antes fizeram roupas e o espaço. Mas ainda ficou o lugar do telefone. O exemplo extremo é o “telefone vermelho”. (Mas o seu acesso físicamente restringido já deu na prática, sem dúvida, lugar há muito ao código secreto digital...)

    Enquanto os vizinhos e os familiares já há algumas décadas têm que concorrer pela nossa atenção, nosso interesse e a nossa participação emocional ("Anteilnahme") com personágens fictícias (ou reais mas distantes) nomeadamente da televisão, desaparece agora, no tempo dos telemóveis e portáteis, também o lugar distinto da telecomunicação. Hoje posso existir económicamente e socialmente, e estar ao mesmo tempo em nenhum lado.
    Compramos uma liberdade nunca visto como o sacrifício do lugar.
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    Na interrogação sobre o que pode ser o arquitecto é útil pensar no colega, que os arquitectos “verdadeiros” talvez respeitam como artista, mas como colega a sério, arquitecto, não levam inteiramente a sério: o cenarista. Recorda-se como o seu metier já mudou no decurso da história: da arquitectura de pedra do teatro de Palladio, pelo cenarismo do desvão da ópera do século XIX (Schinkel), pela luminonotecnia e pelo maquetismo de cartolina de Metropolis até aos cenários immateriais dos nossos tempos (Senhor dos Aneis). Quando os arquitectos (e como se viu, arquitectos da primeira linha) fazem cenários, isto é uma especie de etude, uma coisa não totalmente séria, porque o que se constroi aqui é um mundo simulado, um mundo contraposto ao real para o curto tempo do espectáculo – enquanto a sua profissão verdadeira - óbviamente - não é a produção de simulações de mundos, mas a concepção ("Gestaltung") do mundo real, e não de maneira efémera, mas permanente, de preferência eterna: firmitas!

    Já se vê como será profundo o impacto sobre a ideia que o arquitecto tem de si, quando terá de abandonar a distinção entre o mundo real e virtual!

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